Crítica – SOAP

“A esquerda branca está morta” declara uma das personagens de SOAP, dirigido Tamar Guimarães. É uma boa síntese da obra, que acompanha os esforços de um grupo de intelectuais – brancos em sua maioria – buscando maneiras de combater a crescente onda fascista no Brasil e no mundo, enquanto encaram a rotina pandêmica. O plano é criar uma novela que colocaria no ar mensagens de esquerda, sob a guisa de ser uma trama conservadora.

Assim, dentro de seus apartamentos, no Brasil e na Alemanha, os personagens discutem os aspectos dessa obra, ao mesmo tempo que externam preocupações sobre os vizinhos bolsonaristas, a necessidade de uma renovação política, tudo dentro de seus apartamentos, por meios de conversas de Zoom, grupos de whatsapp e afins. No entanto, todos os esforços se dissolvem, e em dado momento, ninguém consegue se entender mais. Um acusa o projeto de ser de má-fe, outro declara que o Marxismo está morto, e tudo entra em um ciclo de discussões que levam a lugar nenhum.

Há certa graça nessas cenas, onde os personagens declaram seus anseios para o mundo, mas que, no momento, mal conseguem sair de seus apartamentos. Além disso, as conversas pouco agregam a qualquer tipo de necessidade real da população. Tamar explora bem esse alienamento e distanciamento,  com a montagem  evidenciando o espaço diminuto ocupado por essas pessoas, assim como sua desconexão. Caso SOAP se encerrasse nesse tópico, teríamos um belo e crítico curta apontando o fracasso de uma certa esquerda que quer fazer tudo, mas não possui contato o suficiente com a realidade para ter tração em seus anseios.

Mas a produção não acaba aí, ela continua, por mais um bom tempo, que acaba tornando o bom começo uma memória distante. Originalmente, SOAP era uma exposição em seis episódios que foi transformada em longa especialmente para a Mostra de Tiradentes. Séries que viraram longas e vice e versa não são novidade, mas é preciso um cuidado nessas transições, afinal, são formatos diferentes. Contudo, essa preocupação parece não ter sido apresentada na hora da edição, e a narrativa se torna extremamente morosa e dispersa, perdendo o eixo narrativo do começo.

O pior é que os idealizadores da produção parecem não confiar muito na capacidade do público em acompanhar o desenrolar do filme. Além dos seis episódios, existe o capítulo “6 1/2”, que simplesmente recapitula todos os acontecimentos do filme, narrado por uma das atrizes. Há até uns poucos momentos de recontextualização, onde o comportamento de alguns personagens são comentados, mas no geral, é somente uma reapresentação de tudo que foi visto momentos atrás, com cenas inteiras se repetindo. Uma falta de confiança na própria narrativa que beira o incompreensível. 

Esse texto faz parte da cobertura da 27ª Mostra de Cinema de Tiradentes.

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