O espetáculo visual em Godzilla II: Rei dos Monstros
Em 2014, Godzilla retornou aos cinemas americanos após muitos anos de ausência. Sua incursão anterior havia sido ainda nos anos 90, mais precisamente em 1998, sob o comando de Roland Emmerich. Já a dos anos 2010 foi dirigida pelo então novo Gareth Edwards, que viria a comandar Rogue One anos mais tarde. A busca nessa novidade foi trazer o monstro sob uma ótica quase endeusada, em uma distinção aos humanos. O personagem destrói sem medo algum para atingir seu objetivo de matar um outro, causando efeitos gigantescos perante aos pequenos embaixo. Edwards destaca isso solenemente ao buscar sempre uma câmera abaixo, exaltando essa magnitude do animal.
Em 2019, Michael Dougherty foi o responsável por realizar a continuação. Em Godzilla II: Rei dos Monstros, tudo se modifica. Aqui, o espetáculo do visual se torna algo primordial para um entendimento da ação. Michael busca criar uma obra úncia e bastante sua. Na trama, o casal de cientistas Mark (Kyle Chandler) e Emma (Vera Farmiga) acabam se separando após perderem seu filho mais novo no ataque de Godzilla. No momento atual, a filha mais velha dos dois, Madison (Millie Bobby Brown) tenta reaproximá-los, preocupada com a situação de sua mãe. No meio de todas essas questões, indícios sobre a volta do ser começam a aparecer – ele está desaparecido há 5 anos -, enquanto novas figuras mitológicas começam a surgir.
Dougherty, como dito acima, busca algo bastante próprio em sua narrativa. Para gerar um certo universo particular que seja particular e coeso na franquia ao mesmo tempo, ele vai até o limite na sua relação imagética. Ele usa e abusa de uma iconografia mitológica, trazendo uma conexão de cores para cada monstro, além de trazer uma certa admiração a esses seres. Toda essa exaltação bastante religiosa aparece precisa na última sequência ainda mais diretamente. A cena de Ghidorah se exaltando como quase um deus da morte é exacerbada pela presença da cruz no meio das trevas. Da mesma forma, o toque de Madison em um deles, logo no início, exalta essa presença estranha, porém instigante. A câmera lenta também acompanha boa parte dos acontecimentos, trazendo um olhar mais atento do telespectador para todos os detalhes da imagem. Existe uma gigantesca maneira de homenagear toda a imensidão desses poderes, ao mesmo tempo trazendo a irrelevância humana (apresentada no longa anterior, como acima explicado).
Apesar desse espetáculo visual, é intrigante a forma em como a construção dramática aparece aqui. Apesar de ser bem mais interessada em uma conexão direta, especialmente entre pai e filha, há uma edificação do porquê de realizarem tais atos. Emma parece sentir mais essa culpa pela morte de seu filho, por possuir uma ideia meio pacifista de mundo. Ela, por sinal, até traz uma discussão sobre poluição da natureza pouco explorada, rememorando um pouco o original de 1954. Esse fato acaba por nunca ser realmente um enfoque da trama, todavia ele serve sempre para gerar uma colisão política no mundo. Para além disso, seu sofrimento é colocada em prática por duas atitudes mais catárticas da personagem, no segundo e no terceiro ato.
Ainda nessa coesão dramática, é interessante o caminho dado aos personagens da organização estudiosa dos monstros. Ishiro (Ken Watanabe) talvez seja o mais dimensionado de todos, pelo fato de suas perdas representarem um sofrimento verdadeiro. Até um ato mais acentuado no fim do 2º ato gera consequência bem intensa a todos na sua volta, pelo simples fato de uma necessidade. Esse jogos até de perdas é importante para a progressão da narrativa, especialmente no roteiro baseado nas batalhas entre os animais gigantes. Os instantes finais se reversam mais a esse orgasmo visual – proposto desde o primeiro minuto. Mas, a continuidade da história traz um paralelismo de um drama bastante necessário. De fato, ele é apresentado raso, entretanto acaba sempre sendo relevante a todas as mortes, ferimentos e tensões constituídas na produção.
Godzilla II: Rei dos Monstros é um filme muito mais preocupado com toda a conexão e espetáculo visual do que propriamente com seus efeitos. É uma obra quase homenagem a toda a iconografia de monstros, mas apresentando um desenvolvimento muito mais feito pela base do drama. Os efeitos e ações ocorrem justamente nesses e na sinergia com a grande escala, na qual aparece de maneira bastante vagarosa. Michael Dougherty é um diretor tão feliz nessas forças das imagens que chega até a mostrar elas na tela repetidamente, parar alguns segundos para exaltá-las. Ele busca um DNA bem próprio, dentro de uma encenação até bastante esperada nas resoluções. Dougherty quer olhar para os monstros e construir seres messiânicos, construir o porque dos humanos estarem no meio deles. Com isso, os novos deuses caminham, sem medo em quebrar qualquer lugar.