Os pesadelos estão realmente nos nossos sonhos?
Durante a GGRF 2018, o Artist’s Alley estava recheado de artistas buscando divulgar seu trabalho da melhor maneira possível. O conteúdo era variado: fanarts, ilustrações e até publicações originais, mostrando que os artistas brasileiros estão sempre buscando se diferenciar dentro do mercado nacional de literatura e quadrinhos, uma oportunidade proporcionada por eventos como o Geek and Game Rio Festival.
Uma das mesas era da Farpa Editora – que é totalmente independente, criada e administrada pelas quadrinistas Mayara Lista e Paula Cruz. Hoje eu durmo cedo é a primeira publicação em conjunto de ambas, em um trabalho que desperta questões bem maiores que o simples consciente normal, mas adentra em um debate do inconsciente coletivo (ou não) que está na cabeça de todos. Isso tudo dentro de pequenas histórias divertidas e sem um nível de pretensão alto. O mais interessante e intrigante desse fator é que, segundo as próprias, todos os casos são inspirados em sonhos que realmente aconteceram.
Quatro curtas, se pode ser dito assim, compõem o volume. O primeiro, intitulado Branco e feito por Paula, é o mais surrealista de todos. Não apenas no traço, que mostra muito pouco, mas também no quesito da própria narrativa, que envolve algo mais próximo do terror, lembrando inclusive algumas cenas do filme A Bolha Assassina.
Já o segundo, se trata de algo bem mais político, bizarro e, até, engraçado. Lista brinca um pouco com a palavra golpe – que dá nome à memória – misturando-se com a figura do presidente Michel Temer. Ok, é um sonho, algo bem maior do que o nosso controle pessoal, mas a cabeça da artista realmente mostra ter um posicionamento político bem claro. Além disso, o traço é mais uma mistura de realista com uma charge, o que gera um entendimento interno bem coeso para a trama.
No terceiro, tem-se novamente Cruz tomando controle em Cândida. O lado surrealista da autora veio a tona novamente, mas dessa vez em algo bem mais nojento e quase alienígena. Além de ser quase uma ironia com a menstruação, a narrativa se destaca também pela proximidade com elementos de fantasia e horror.
Por fim, Linguagem Jovem é mais uma de Mayara. O desenho, dessa vez, lembra um pouco de Bryan Lee O’Malley, o criador de Scott Pilgrim, com uma mistura de cartum e irrealismo. O cômico é o foco dentro da trama, que fala sobre esse ímpeto brasileiro para brincadeiras e, do mesmo modo, para a comédia, algo que gera um sentido interno para os acontecimentos mostrados.
Além desse trabalho, a mesa das duas contava com diversas outras artes para compra e Naruna, uma HQ criada pela própria Mayara.
A segunda edição da GGRF serviu como oportunidade incrível para conhecer o material incrível produzido pela Farpa Editora, principalmente o quadrinho Hoje eu Durmo Cedo. É uma obra única, que merece ser reconhecida e valorizada dentro da nona arte no cenário nacional, onde é possível ver diversos nomes crescendo cada vez mais. O problema é que ninguém parece estar vendo isso.