Crítica – Cabras da Peste
Tão representativo do cinema americano quanto o faroeste, o gênero buddy cop é vasto e já rendeu muitas produções, além de ser base para algumas franquias de sucesso, como Máquina Mortífera e A Hora do Rush. Isso se dá pela sua flexibilidade, visto que o par principal pode ser constituído de diversas combinações possíveis, desde que existam diferenças a serem superadas pelas partes, seja cultural, de temperamento, etária e etc. Assim, nada mais natural que o cinema nacional tente sua mão no gênero também, que é o caso com Cabras da Peste, filme da Netflix.
No longa dirigido por Vitor Brandt, acompanhamos dois policiais em cantos distintos do país. O primeiro deles é Bruceuilis (Edmilson Filho), um comissário cuja disposição para ação não cabe na pequena cidade de Guaramobim, no interior do Ceará, onde não ocorrem crimes graves. Já em São Paulo, temos Trindade (Matheus Nachtergaele), policial covarde e que prefere ficar no escritório, mas que acaba participando de uma operação para tentar capturar o misterioso traficante Luva Branca, a ação dá errado, por culpa de Trindade, que acaba sendo transferido para um setor escondido. Enquanto isso, Bruceuilis recebe a missão de cuidar de Celestina, a cabra símbolo da cidade, que é acidentalmente sequestrada por um caminhão de rapadura. Decidido a resgatá-la, o comissário rastreia o caminhão até São Paulo, unindo forças com Trindade, porém entrando em rota de colisão com o Luva Branca.
Se você já viu algum outro filme em que dois policiais de indoles distintas se unem para resolver um crime, então muito pouca coisa na trama de Cabras da Peste será surpresa, já que ele segue à risca o molde de produções do tipo. A graça fica pela tradução das situações típicas do buddy cop, como uma interrogação onde um é o “policial bom” e o outro “mal”, para o cenário brasileiro. A visita a um restaurante japonês, por exemplo, que lembra um pouco situação similar em A Hora do Rush, acontece. Mas ao invés de um restaurante populado por japoneses, temos nordestinos no lugar. Por vezes, no entanto, o contraste entre a dupla principal, algo tão importante para a narrativa, se perde um pouco, já que os dois são figuras um tanto atrapalhadas em seu modo de ser. Apesar disso, a atitude mais proativa do comissário em oposição a postura retraída de Trindade consegue funcionar bem na maioria das vezes.
A presença de Edmilson Filho remete muito aos trabalhos do ator com o diretor Halder Gomes, produtor dessa empreitada. Ele que realizou obras similares, como Cine Holliúdy e O Shaolin do Sertão, que também se preocupavam muito em trazer para um cenário mais nordestino, que até periga ser estereotipado, mas nunca o é, já que essa questão nunca é o foco de zombaria, partindo de um evidente carinho pelas características mais singulares da região, como expressões, costumes e afins.
Apesar de ser uma paródia pura e simplesmente, existe algo a ser destacado nas cenas mais voltadas para a ação de Cabras da Peste, especialmente as que envolvem Bruceuilis. Elas contam com uma coreografia surpreendentemente competente, evidenciando uma preocupação não só com as piadinhas, que em algumas poucas ocasiões funcionam, caindo em um besteirol excessivo. Em suma, Cabras da Peste é uma comédia leve, que se não vai incendiar o mundo com as piadas, garante algumas boas risadinhas. Não busca reinventar a roda, mas somente dar uma roupagem diferente a ela, e, é claro, com sotaque nordestino.