Crítica – Anéis de Poder (Primeira Temporada)
Quando foi anunciada, muito se questionou sobre quais momentos marcantes da Terra Média que Anéis de Poder iria passar. Inicialmente, apenas era sabido que seria antes de toda a saga principal do anel (que se inicia em O Hobbit) e em um período auge da cidade de Númenor. Contudo, o nome parecia sugerir que estaríamos em contato com uma produção que iria tratar, de uma forma ou de outra, sobre a construção dos anéis clássicos de todo universo de Tolkien. No entorno disso, os oito primeiros episódios do seriado – que já tem cinco temporadas confirmadas – buscam ser um grande prelúdio para o que veremos pela frente, mas, ao mesmo tempo, avançar muito para o que público quer ver da história.
A primeira temporada se concentra em quatro núcleos principais, que são os grandes fios condutores da narrativa. O primeiro, da grande protagonista, a elfa Galadriel (Morfydd Clark), e seu encontro com o humano Halbrand (Charlie Vickers); o segundo, do elfo Arondir (Ismael Cruz Cordova), que tenta ajudar uma pequena comunidade de um ataque de orcs; o terceiro dos pés-peludos, sob a visão de Nori (Markella Kavenagh) e a chegada do Estranho (Daniel Weyman); e, por fim, da tentativa de retomar uma aliança rompida entre elfos e anões, em que estão no comando os amigos Elrond (Robert Aramayo) e Durin (Owain Arthur). Através desses quatro ambientes diferentes, que vão se eclodindo com o passar dos acontecimentos, desembocamos na volta do mal para o continente e no reaparecimento de Sauron.
É interessante como a criação de Patrick McKay e John D. Payne tem um claro apreço pela mitologia do universo original e não busca se desvincilhar em momento algum, mas também é uma série que quer ter sua voz. Desse jeito, vemos ecos um tanto quanto confuso em termos narrativos. Ao mesmo tempo que remete bastante a um uso de closes e uma certa aura mística do mundo, advindas diretamente dos escritos e dos filmes de Peter Jackson, também traz uma visão de explorar as diversidades pouco faladas anteriormente. Isso está muito presente em Arondir, que, ao mesmo tempo que é renegado pelos elfos e pelos humanos, é também uma figura que busca o bem dos dois. Acima de tudo, é alguém que é quase excluído da sociedade que convive.
É dentro dessas vozes que Anéis de Poder encontra seus melhores momentos. Na lentidão e na construção de personagens complexos ao longo de ao menos seis episódios, é aonde encontramos os instantes mais diretos de um entendimento profundo sobre em que local iremos desembocar. Por isso, a própria trama não esconde os acenos para uma audiência que é fã dos livros e filmes (como na aparição importante de Isildur), contudo está realmente em busca de consolidar uma história particular. Essa, cheias de liberdades, com até personagens novos, como o grande vilão da temporada, Adar (Joseph Mawle), e que são igualmente complexificados e geram um andamento das tramas.
Apesar disso, o seriado, em muitos casos, acaba perdendo um pouco dessa voz original, especialmente nos dois últimos capítulos. Cheios de revelações e dando caminhos para o futuro, eles também são os mais apressados em termos do desenvolvimento até ali. Se tudo parecia mais calmo e dando tempo ao tempo – gerando até críticas por parte da internet -, o fim quer apressar em muitos aspectos para deixar algo para um futuro. Dessa forma, algumas resoluções que poderiam aguardar mais, logo acontecem, especialmente na relação entre Halbrand e Galadriel. A própria obra agiliza certas questões e acaba com a própria tensão que estava tendo anteriormente, sobre quem seriam determinados personagens. Com tudo entregue de bandeja, quase não faz sentido toda a tensão do whodunit anteriormente.
Apesar disso, Anéis de Poder é uma das séries de fantasia recentemente a mais não ter medo de arriscar. Seja narrativamente ou em termos da construção de universo, ela busca ser realmente única, palpável. Assim, todos os cenários e a relação dos personagens com eles são fundamentais para tudo que acontece. Apesar de certos acasos (como a espada no fim do sexto capítulo), ela realmente abraça seu papel como fantasia, essencialmente fantasia medieval. Não teme as próprias contradições e brincadeiras, além de saber usar o que teve de melhor com Jackson e com os escritos de Tolkien. Apesar de não ser perfeita, a série abre uma grande porta para a frente. Porta essa capaz de unir até os fãs mais ferrenhos e aqueles que apenas admiram aglumas coisas desse mundo. Mas esses, ao fim do último episódio da primeira temporada, com certeza estarão dando um sorriso, ansiosos pelo que virá.
