Crítica – O Desconhecido

Aviso de SPOILERS para O Desconhecido

Se relacionar com alguém sempre é um risco, pois envolve a necessidade de se abrir. Dessa maneira, os sentimentos podem tanto “sair”, quanto a pessoa transmitir coisas para você também. E se o seu trabalho requer que você crie um relacionamento com uma pessoa “má”? Como colocar as barreiras necessárias para que essa relação não vá além do estritamente necessário? A proximidade gera empatia.

Em O Desconhecido, o policial Mark (Joel Edgerton) encara esse dilema, ao ser encarregado de se aproximar de Henry Teague (Sean Harris), suspeito de um crime envolvendo um menor de idade. A ideia é que Mark faz parte de uma organização capaz de criar uma nova vida para criminosos, e extrair uma confissão de Henry. Mas o longa, dirigido por Thomas M. Wright, não é exatamente um filme policial, e se volta mais para o drama existencial, na veia de True Detective, para citar um exemplo recente.

E assim como a famosa série da HBO, a produção australiana é sombria, tanto metafórica, quanto literalmente. É comum os personagens estarem completamente imersos na escuridão, sem qualquer cenário discernível ao redor, e num filme em que boa parte dos acontecimentos envolve o trânsito de um lugar para o outro, isso é um tanto desorientador. Não afirmo isso de modo negativo, pelo contrário, parte da graça, se pode chamar assim, é tentar não se perder, uma sensação que cria um paralelo com o protagonista, cuja vida entra em certo desarranjo ao participar da missão.

Henry começa a ser uma parte importante da vida de Mark, e sua presença começa a se infiltrar na vida civil do policial, que começa a vê-lo em seus sonhos, no canto do olho. Não há dúvidas de que ele já enxerga seu “alvo” como uma espécie de monstro, que se esconde onde ninguém ousa olhar. Isso não impede, no entanto, dele criar uma simpatia pelo suspeito. Após ele confessar o crime, por exemplo, ele abraça o criminoso, e afirma estar orgulhoso dele, algo que vai um pouco além do seu papel.

Entre as cenas com Henry e Mark e toda a encenação que os envolve, Wright entrecorta com cenas mais devidamente “policiais”, com a detetive Kate Rylett (Jada Alberts) conduzindo a investigação de modo mais formal. Aqui, O Desconhecido se assemelha a um procedural, e, por vezes, é quase documental na forma de retratar os procedimentos, e aqui vale lembrar que a narrativa tem como base uma história real.

A montagem embaralha um pouco demais as coisas conforme se aproxima da conclusão, brincando com a não linearidade de modo um tanto desnecessário, visto que a situação já estava mais que clara, sem a necessidade de explicitar os processos que levaram Mark aquela situação. Não à toa que talvez o melhor momento da conclusão não envolva nada do lado policialesco da trama. O protagonista, após cumprir sua missão e conseguir a prisão de Henry, deixa escapar uma pequena lágrima, rapidamente escondida. Qual o custo de fazer amizade com o abismo?

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