Crítica – Querência

As tradicionais boiadas são algo típico de um interior brasileiro. Ao mesmo tempo, também perpassadas de formas diferentes em outros locais de mundo, se tornam um aspecto tipicamente cultural de determinadas regiões. Isso faz parte bem clara da trama de Querência, que irá explorar seus personagens através dessa realidade, de uma visão de mundo que se limita bastante ao trabalho. E o trabalho nesse local bem específico. Essa visão limitada de um universo constrói uma narrativa pautada muito mais em uma relação interpessoal, especialmente na confiança. Isso tudo se centraliza bastante no conceito da fé, de acreditar, especailmente quando se está em cima de um boi. E é através disso que a obra trabalha.

A direção de Helvécio Marins Jr. se estabelece bastante através de um olhar quase documental, passivo desse mundo consolidado. Com tudo isso, acompanharemos a trajetória do protagonista Marcelo (Marcelo Di Souza), a qual vive sua vida através dos rodeios. Contudo, uma tragédia pessoal acaba o afetando em determinado momento, tornando-se um trauma. Toda essa perspectiva vai se transformando em uma verdadeira dificuldade de lidar com tudo novamente. E essa grande marca na vida do personagem sempre terá o olhar de uma certa compaixão, aproximado, por parte da câmera de Helvécio.

A busca em Querência não é tanto ser algo grandioso ou complexo, mas um verdadeiro estudo da situação. É isso mesmo. Através de um olhar bastante de fora, porém que busca entender os porquês de cada um dos personagens, há uma brusca visão sobre a elucidação desse ambiente. É como se tudo ao redor pouco importasse – o que ganha ainda mais sentido pelo fato de vermos poucas cenas exteriores, no meio da cidade. O que realmente está em jogo de tudo ali é a simples existência em um mundo que isso possa parecer mais complexo, confuso, a cada novo momento.

Isso torna toda a narrativa do filme até bastante repetitiva. De certa forma, existe um tratado que busca realmente esses acontecimentos “esperados” diariamente, como se fosse uma triste vida que apenas se repete. Todavia, também decorre um olhar que tudo se torna bastante passível. Enquanto a obra está olhando para um fundo que vangloriza toda essas circunstâncias do ponto de vista de Marcelo (transformando qualquer coisa em algo gigantesco, especialmente na boiada), a câmera se torna um elemento frio, calculista, como se estivesse esperando uma próxima sequência para construir algo grandioso, mesmo sem realmente estar querendo dizer aquilo.

Nesse sentido, o longa se torna até bastante oco em sua parte final. Enquanto os acontecimentos desenrolam para um segmento dramático, até envolvendo um lado judiciário e de luta pela justiça (construídas muito bem na sequência final), todo o resto parece estar trilhando para um caminho de apenas deixar isso acontecer. É como se o diretor não buscasse realmente construir nada em cima do que se tem. É uma tentativa de extrair o real, que acaba não funcionando.

Em sua repetição imagética, Querência parece realmente querer buscar significados maiores em uma vida comum, em um cosmo que pouco acontece. Contudo, é curioso como a busca em tentar ser maior, mais complexo, torna o longa apenas insosso, distante de qualquer construção dramática. Ao fim de tudo, Helvécio Marins Jr. tenta até construir algo maior em cima de uma vida apenas banal. Porém, o que acaba trazendo é o vazio, em cima de uma trama com diversas possibilidades.

Comentários

Cláudio Gabriel

É apaixonado por cinema, séries, música, quadrinhos e qualquer elemento da cultura pop que o faça feliz. Seu maior sonho é ver o Senta Aí sendo reconhecido... e acha que isso está mais próximo do que se espera.

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