Descubra como o Brasil foi um dos responsáveis pelo sucesso de Sandman

A chegada da série de Sandman na Netflix ressuscita a importância que o Brasil trouxe para o sucesso mundial dos quadrinhos nos anos 1990. É uma trajetória que remonta muitas coisas – em especial, um momento de estrondo das HQs em terras nacionais. Mas, antes, é preciso entender como isso tudo aconteceu e, principalmente, como a obra veio parar no Brasil.

Era final dos anos 1980. Os Estados Unidos viviam uma epopéia de grandes produções de quadrinhos, em especial aquelas que buscavam tramas mais adultas, complexas e fugiam de um esteriótipo infantilizado que a nona arte ganhou em anos anteriores. Era o período também da chamada Invasão Britânica nos Quadrinhos, um capítulo a parte nessa trajetória. Tudo aconteceu muito conectado com a explosão da Inglaterra mundialmente na cultura, desde com os Beatles (nos anos 1960-70) até na moda. Nessa época, nomes como Alan MooreGrant MorrisonPeter Milligan e mais, são convidados para escrever nas revistas americanas. A maior responsável foi Karen Berger, editora da DC e fundadora da Vertigo, selo pelo qual boa parte dessas tramas sai. O sucesso de Monstro do Pântano, de Moore, durante 1984 até 1987, fez com que esses escritores e desenhistas ganhassem mais e mais espaço. Então, em 1988, aparece uma ideia de roteirista Neil Gaiman: Sandman.

Inicialmente, Gaiman queria fazer uma história da Orquídea Negra, que teria os desenhos de Dave McKean. Só que, pela falta de conhecimento do público com seu nome, foi escolhido que ele começasse com algo menor, uma trama autoral. Por isso, o escritor resolveu trazer de volta um dos personagens esquecidos da editora de anos passados. Sandman, criado por Jack Kirby na década de 70, pouco tinha feito sucesso. A nova roupagem, que trazia elementos góticos do momento, junto com toda uma perspectiva filosófica, fez a obra explodir. As primeiras edições (de um total de 75, na primeira era) já a tornaram um sucesso de crítica e de público, fazendo com que a HQ fosse exportada internacionalmente.

Assim, já no ano seguinte, a editora Globo lança a obra pelas nossas terras. Os quadrinhos foram divulgados até 1998. As vendas eram tão grandes que a editora até chegou a ousar em alguns momentos, ao publicar minisséries encadernadas e até compilar os primeiros volumes em uma edição única. Além disso, em 1997 e 1998, as editoras Abril e Metal Pesado também chegaram a lançar outras séries atreladas ao Sandman principal, como a especial Sandman – O Teatro da Meia-Noite, em que havia um crossover com o personagem da Era de Ouro.

Nesse período, Gaiman esteve pela primeira vez em solo brasileiro e atraiu uma multidão para ver ele durante o prêmio HQ Mix, em 1995. Foi tratado como um rockstar e parece ter gostado disso, já que, depois desse episódio, sempre falou bem do país quando questionado. Por isso, o autor lembra, em entrevista à Folha agora para o lançamento da série, que “o Brasil foi o primeiro país a adotar Sandman (…) Foi a primeira tradução, numa edição linda, repleta de textos explicativos e uma contracapa com detalhe da arte. Ainda tenho o pôster dela na parede da minha casa”, conta.

Gaiman na Flip 2008. Foto: Michel Filho / Agência O Globo

O britânico ainda voltou em outras duas oportunidades. Em todas elas, foi tratado do mesmo jeito que da primeira, ou seja, valorizado no status de ídolo – algo até bem incomum para quadrinistas estrangeiros por aqui. Em 2001, participou de uma sessão de autógrafos. Em 2008, também causou estrondo na pequena cidade do interior do Rio de Janeiro, Paraty, na Flip. Na ocasião, chegou a dizer que se sentia um “jogador de futebol” e fez os fãs esperarem até cinco horas na fila para pegar um autógrafo.

É difícil tentar elencar os motivos que fizeram Sandman se transformar no sucesso que veio a ser no Brasil. Em um período de uma grande tiragem de histórias em quadrinhos por aqui, talvez essa tenha tocado de forma bem curiosa o coração dos leitores. Até porque Neil Gaiman lançou, desde então, livros, quadrinhos e até mesmo a tal Orquídea Negra que ele buscava fazer inicialmente. Entretanto, Sandman parece nunca ter sido esquecido pelos apaixonados na nona arte. O destaque é tanto que o que não falta no mercado são opções de edições variadas e únicas da obra. O mito do senhor dos sonhos realmente tomou a cabeça dos brasileiros para sempre. Agora resta saber se a sua adaptação irá seguir o mesmo caminho.

Comentários

Cláudio Gabriel

É apaixonado por cinema, séries, música, quadrinhos e qualquer elemento da cultura pop que o faça feliz. Seu maior sonho é ver o Senta Aí sendo reconhecido... e acha que isso está mais próximo do que se espera.

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