O Imortal Hulk e o horror
“Há sempre duas pessoas em todo espelho”. Com essa frase enigmática somos colocados dentro da história de O Imortal Hulk, em seu primeiro volume, escrita por Al Ewing e desenhada por Joe Bennett. A HQ, premiada no Eisner como “Melhor Série” apresenta um Hulk um tanto quanto diferente. Ele aqui parece ter aceitado de vez toda sua condição física e psicológica, restando simplesmente conviver com ela. No entanto, há uma busca eterna e o conflito existente entre suas duas personalidades. Assim, somos levados a maior pergunta desse início: Homem, monstro… ou ambos? Como Bruce Banner/Hulk poderia ser definido, caso colocado em alguma categoria.
Desse complexo jeito somos postos dentro de uma narrativa um tanto quanto complicada e arraigada. E isso, impressionantemente, não é um sentido negativo para essa questão, apenas uma constatação. Em diversos momentos é possível quase perceber um estilo dramático bem característico da Era de Prata dos quadrinhos, com diversos diálogos entrecortados e uma arte na qual traz todo esse peso contido. E, nesse ponto, é possível perceber muito bem como o protagonista se comporta quase como uma confusão ambulante, sem saber muito bem o que seria. Ele busca questionamentos internos, para depois ser interpelado pela figura monstruosa (“a noite chegou e agora é a hora dele”).
A imagem acima ilustra bem toda essa capacidade do quadrinho de buscar as capacidades do personagem título. Bennett escolhe não aquela forma clássica de um humano gigantesco e verde, mas busca traços bastante animalescos. Os olhos expressivos, sua violência e brutalidade perante qualquer pessoa. Esses elementos recorrem a uma certa distância do público perante a Banner. Ele não é mais simplesmente o mocinho das histórias da Marvel, porém adquire um papel de um ser constante mutação. De um humano, na sua essência. Ao mesmo tempo que, também, de um monstro modificando todos os seus elementos físicos.
Ele assume, desse jeito, características similares a Wolverine, por exemplo. Contudo, há uma busca por uma grande filosofia por detrás de tudo, não a toa esse desenvolvimento pautado na relação entre pai e filho, onipresente nesse primeiro volume. É interessante perceber que, ao chegamos no fim das páginas, pouco tiramos de uma conclusão exata sobre o que aconteceu. Vemos pessoas quebradas por todos os lados e uma tentativa de entendimento sobre si de cada uma delas. Inclusive, do assaltante logo na abertura. Esse, a primeira vítima de uma fúria social colocada na figura do Hulk, acaba por ser mais uma das personas desenvolvidas em torno da ideia da personalidade.
E é nesse sentido que percebmos como há dentro dessa obra uma carga de desenvolvimento psicológico e emocional. Como diz o próprio Ewing em seu texto final, “O que você acha?”. Seríamos apenas homens, seríamos monstros ou um híbridos dos dois? É quase impossível responder sem repensar sobre as diversas ações e atitudes não humanas provocadas pelos dito humanos. Assim como seria impossível não repensar toda a mitologia dos heróis. Eles seriam realmente salvadores de algo? Ou simplesmente ególatras? É complexo quando esse questionamento chega mais afundo até dentro das próprias HQs das grandes editoras.
Com todos esses elementos, é impossível não admirar um quadrinho como O Imortal Hulk. A carga filosófica trazida por detrás desses elementos primários de uma narrativa – já intrigantes por si só -, corroboram toda uma temática sobre solidão e isolamento dentro do meio social, além de pensamentos sobre o que realmente nos tornaria humanos. Se esse debate tem sido realizado perante as máquinas, pelo fato das emoções não estarem contidas naturalmente nelas, por que não pensar nisso sob uma perspectiva dos mesmos humanos? Afinal, estamos todos sob a mesma conduta dita ética e moral. E aí? Seríamos, com essa questão, seres humanos, monstros ou os dois?