Walter Franco para nossos tempos
Walter Franco se foi – o mais maldito dos malditos, dizem. Muita tinta já se gastou para falar e entender esse artista “vanguardista”, na qual acabou sempre sendo entendido em conjunto com Jards Macalé, Mautner e outros. O estranhamento sempre foi a mãe da desconfiança e da confusão e Walter, aquele maldito, causou muita desconfiança e confusão.
O compositor, autor, músico e artista foi consagrado pela negação: as vaias que ressoaram no Festival da Canção de 1972 jogaram holofotes para a sua produção musical, já tida como experimental naquela época. Nara Leão – presidente do juri – defendia a coroação da “Cabeça” de Franco. Porém, foi “Fio Maravilha”, de Jorge Ben, cantado pela também maravilha Maria Alcina, que acabou ficando pelas cabeças. A repercussão negativa (será mesmo?) do público não jogou Walter nas facilidades do mercado.
Logo depois lançou Ou Não (1973), com letras complexas e com grande influência da Poesia Concreta paulista (Irmãos Campos e Pignatari – este último participante do júri do Festival de 1972). Não deve ter sido coincidência o lançamento no mesmo ano do disco mais experimental de Caetano Veloso, Araçá Azul (ambos fracassos comerciais). O espírito do tempo era de experimentação e radicalismo musical. É importante lembrar do período complexo politicamente no país. Experimentar era lutar. E Walter continuou experimentando e radical.
Comentar a obra de Franco sem cair no exotismo e no tatibitati da crítica musical, na qual joga todas essas produções na vala comum dos malditos ,talvez seja o melhor caminho para dar conta da sua complexidade musical e sonora. Sua música talvez seja como ele cantou em Canalha (1980) “ É um grito que se espalha/Também pudera/Não tarda nem falha/Apenas te espera/Num campo de batalha.” No campo de batalha das ideias musicais, a artilharia desse gênio da música brasileira era fundir a cuca num grito.
Uma vez mostrei para um colega o disco Revolver (1975) e ele me disse que tinha a impressão que Walter cantava rindo. Como se fizesse troça do que diz e de quem ouve. Esse espírito de não se levar a sério, e não levar a sério seu ouvinte, mas sem perder jamais a seriedade de seu trabalho, fará falta para a música brasileira. Sua altivez tranquila junto da sua experimentação talvez seja a receita para se lidar com tempos tão sombrios. Walter, ao fim disso tudo, até nos deixou uma receita que sempre era cantada repetidamente em seus show: “Tudo é uma questão de manter/ A mente quieta/A espinha ereta/E o coração tranquilo”.