Crítica – Detenção

Viver sob um regime opressivo causa um sem fim de complicações a uma nação. Não só em um nível nacional, mas também nas relações individuais. O clima de paranóia, o incentivo a denunciar o mínimo comportamento que possa ser considerado “subversivo”, acabam criando uma atmosfera onde a mínima desavença pode ganhar conotações políticas, e também fatais. Detenção, do diretor John Hsu, tem seu olhar voltado para essas situações, tendo como cenário o “Terror Branco”, um período de 38 anos em que Taiwan viveu sob lei marcial, suprimindo dissidentes políticos.

O longa, que é uma adaptação de um game de terror de 2017, acompanha dois jovens estudantes em uma escola taiwanesa nos anos 60. Wei Chung-ting (Tseng Ching-hua) é membro de um clube do livro secreto, onde lêem livros comunistas ou com orientação de esquerda, organizado por dois professores: a Sra. Yin (Cecilia Choi) e o Sr. Zhang (Fu Meng-Po). Enquanto isso, Fang Ray-shin (Gingle Wang) é uma estudante comum, mas que possui sentimentos pelo professor Zhang. Uma noite, Wei e Fang se encontram isolados na escola por acaso após uma forte chuva, mas o local está diferente, depredado, mais sombrio que o normal, e criaturas estranhas circulam o local. Caberá aos dois obter as respostas da situação e saírem vivos desta.

A abertura do longa é muito eficaz em transmitir o clima militarizado do colégio, com as composições dos planos enfatizando o aspecto “ordeiro” do cenário, no entantocom cores mais apagadas, enfatizando a tristeza que toma conta do lugar. Isso causa um contraste curioso com as cenas do clube do livro, por exemplo, que possui planos com elementos mais desordenados e cores mais quentes, acolhedoras. Quando a escola se torna um ambiente ainda mais hostil durante a noite, o bom trabalho com a atmosfera continua, com forte ênfase nas sombras, com certa influência gótica.

É na tradução de aspectos autoritários para o sobrenatural que Detenção se destaca, remetendo um pouco a franquia Silent Hill. Nessa, cujo os monstros sempre refletiam questões psicológicas dos seus personagens. Aqui, um dos monstros reflete a angústia de alguém que foi fiel ao regime, somente para ser torturado do mesmo modo, enquanto outro possui claramente o design de uma figura militar, com o seu método de execução semelhante aos de tortura do comando.

Entretanto, Detenção peca ao não explorar tanto o cenário não sobrenatural da situação, se preocupando mais em replicar certas situações do game do que oferecer mais contexto e dramatização para as situações mais “cotidianas”, por assim dizer. Muito dos horrores da obra dependem das situações do mundo normal, o que resulta em um ambiente interessante de se olhar, mas não tanto de vivenciar. Vale destacar também que a trama adota uma não linearidade da narrativa que pouco ajuda, colocando o espectador meio que de supetão nos aspectos sobrenaturais. Esse elemento só cria uma confusão que não instiga a saber mais, só confunde mesmo.

Assim, Detenção soa mesmo como um filme de videogame, já que, apesar de construir uma atmosfera de modo bem eficaz, a condução da narrativa é um tanto fragmentada demais para causar qualquer impacto. É como se as partes de jogabilidade faltassem entre um momento e outro, para criar um todo coeso.

Filme faz parte da seleção do festival Fantaspoa 2021.

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