Nasce uma Estrela: Amor, música e vício

Adaptar, pela quarta vez, uma história já clássica em Hollwyood era um desafio e tanto para o primeiro trabalho de Bradley Cooper na direção. Muito mais que simplesmente conduzir os acontecimentos, ele agora era também responsável por ser o rosto principal dessa famosa trama, contracenando com um dos maiores nomes da música pop recente: Lady Gaga. A trama quase fantasiosa de paixão entre dois cantores realmente não foge do clichê, porém isso não importa aqui. O que importa é que o Cooper parece saber que quer realmente dar sua cara para Nasce uma Estrela.

Seu trabalho de condução de câmera é literalmente uma aula de movimentação. Se nas cenas de palco é preferível algo menos “limpo” e perfeito – com diversos closes e contra-luzes, salientados pela intensa fotografia de Matthew Libatique -, os momentos de diálogos e aprofundamentos sob os personagens é feito sempre de forma sútil, mas perseguidora. Com alguns planos longos e sequência, o cineasta não esquece a subjetividade ao acompanhar os dois grandes protagonistas. Parando para olhar por esse lado, Bradley constrói quase um documentário de uma realidade inexistente apenas com seu trabalho na movimentação da gravação, digno de Terrence MalikAlejandro González Iñárritu.

Todavia, o direcionamento para a narrativa acaba por não ser tão bem desenhado. Os diálogos acabam expondo demais em diversos momentos, como na cena de briga do protagonista com o irmão, e o apelo emocional se torna pungente no grande clímax do longa. O que poderia ser um final totalmente designado para o ápice de ligação entre o telespectador com aqueles dois, tudo acaba por ser jogado fora em entrecortes extremamente apelativos, faltando o peso da situação se focar em alguma coisa.

A relação entre Ally (Lady Gaga) e Jackson Maine (Bradley Cooper) vive diversos altos e baixos. É possível entender o relacionamento deles, fazer alusões a um abuso crescente, a interdependência. Acima de tudo isso, é impressionante como a química entre o casal é um elemento quase mágico, ainda que seja um elemento passado de maneira abrupta no primeiro ato.

Por sinal, é aqui que entra o lado musical fortíssimo da trama, que acaba sendo um carro-chefe de público para essa obra. Se, nesse primeiro instante, existe ainda uma dúvida sobre essa relação tão forte sem muito tempo para isso, é o palco que transforma um desconforto em naturalidade. Aliás, existe uma conexão intrínseca disso com as escolhas de figurino, que parecem mostrar resistência de um para o outro com tons escuros, que vão se tornando coloridos com o decorrer do tempo. Continuando nesse quesito musical, as letras sempre tentam passar a instalação desse profundo laço que está sendo formado, quase como um compasso de uma canção. É aí que entra duas grandes faixas para expressar toda essa emoção contida: “Shallow” e “I’ll Never Love Again”. A primeira, em um momento de euforia inicial, já a segunda para um êxtase de tristeza.

Apesar de abordar de uma maneira superficial o lado da fama, a história acaba nunca passando muito por isso. Diversos retoques e portas são abertas, como o que teria motivado o alcoolismo de Maine, traço que leva o personagem a protagonizar uma das cenas mais embaraçosas do cinema recente. Todo esse ressentimento contido e pouco expressado parece que tira um pouco da carga maior que o filme poderia explorar, em entender mais profundamente a conexão do casal: falta embasamento para que haja envolvimento.

Para não falar de haver uma inexistência de críticas sobre a fama, existe uma tentativa bem fracassada em dialogar sobre a capitalização da indústria musical com artistas novos e o “sacrifício da personalidade” que vem com isso. O grande problema é isso ficar a cargo de ser realizado pela personagem de Gaga, cantora de diversas canções sucessos da música pop. Talvez se verbalizada por algum outro personagem, até pelo próprio empresário de Ally, tivesse mais impacto, todavia se torna uma tentativa jogada no lixo.

Nasce uma Estrela é uma estreia de peso para a carreira de Cooper. Mais do que isso, é uma sólida promessa para o início da carreira de Lady Gaga  em Hollywood. Se os filmes passados buscaram explorar mais o crescimento dos personagens dentro desse ambiente da música, essa nova versão prefere olhar para caminhos mais humanos e do relacionamento. É como se o longa ecoasse uma mensagem de crença no amor, mas com o objetivo de crescimento conjunto e não da dependência frequente. Se o mundo precisava dessa mensagem? É difícil saber. Entretanto, é inevitável sorrir e emocionar para com uma obra que traz debates relevantes sempre e uma crença (ao mesmo tempo que descrença) do amor tradicional e padrão nos musicais. Essa sim, que deve ser a mensagem necessário para o mundo.

Comentários

Cláudio Gabriel

É apaixonado por cinema, séries, música, quadrinhos e qualquer elemento da cultura pop que o faça feliz. Seu maior sonho é ver o Senta Aí sendo reconhecido... e acha que isso está mais próximo do que se espera.

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