Cobertura – 74 ª Festival de Locarno (Curtas)

Confira nossas críticas de alguns curtas que estão participando do 74ª Festival de Locarno:

Criatura

Há um contraste muito interessante em cena em Criatura, curta de María Silvia Esteves. É uma história muito íntima,muito humana, que é o romance entre duas jovens lésbicas, a narrativa costurando as idas e vindas desse relacionamentos, tanto pro doce quanto pro amargo.

Mas Maria Silvia conta essa história como se fosse uma ópera, com trilha sonora arrebatadora e explosiva que acompanha essa história tão singela. Esse amor tão intenso transforma o mundo a sua volta, pinta o mundo de vermelho, e evoca até imagens de um espaço que, definitivamente, não é humano. É a experiência transcendental do amor, tão humana, ao mesmo tempo que escapa nossa plena compreensão. 

Nota: 3,5/5

Fantasma Neon

“Essa nossa vida não é real, João”

 A existência paradoxal do entregador de delivery. Extremamente importante, já que sem eles os aplicativos não funcionam e os consumidores não teriam a comodidade que tanto desejam, mas tratados como subclasse. Os aplicativos os tratam como descartáveis, a polícia não os vê como trabalhadores, e os clientes parecem enxergá-los mais como obstáculos do que outra coisa.

Fantasma Neon transita essa realidade difícil e um aspecto mais lírico, composto por pequenas cenas musicais, que nem sempre se encaixam muito bem no todo, mas possuem certa graça ao explorar imagem dos entregadores como mais do que somente uma classe explorada, mas sim que podem, e devem, existir além disso.


Nota: 3,5/5

Dihya

Existir fora dos padrões de gênero e buscar afeto dessa maneira. Dihya é parte puro relato e parte exploração sensorial dessa experiência tão complexa. Você pode deixar explícito aquilo que você é, e os outros ainda tentarão te encaixar em outra definição. Encontros sempre resultam no outro reclamando do que você é, ou não é.

É um curta muito centrado nas experiência de uma pessoa LGBTQIA+ nos aplicativos de encontro, e nas reações que isso gera. Amor em uns, ódio em outros, amor, ódio e desejo na mesma pessoa. Como reagir a tanta desumanização? Construindo uma imagem inequivocadamente própria, doa a quem doer.

Nota: 3/5

Atrapaluz

Ser jovem é difícil,especialmente pois sua identidade ainda está sendo construída, e é fácil se deixar levar por aquilo que parece ser mais aceitável, mesmo que não seja aquilo que te excite.

Lila é uma adolescente solitária que gosta de cosplay e construir coisas, como um ciborgue caseiro, mas passa os dias sozinha em casa com suas coreografias. Ela tenta assumir outros hobbies, mas não dá muito certo. Atrapaluz é meio solto em sua construção, as cenas com pouca conexão uma com a outra, apesar de algumas imagens interessantes, elas nunca encontram uma sinergia narrativa, tornando tudo meio esquecível.


Nota: 2/5

Es Muss

O dia de Sylvia (Ruth Schwegler) começa como sempre. Ela pega seu carro na garagem, vai até o trabalho, e trabalha. Mas sua rotina pouco a pouco é dilapidada: perto da sua aposentadoria, perde seu emprego devido a uma “reestruturação”, recebe uma multa por motivos ridículos e no seu hobbie, canto de coral, é passada para trás no solo. Não é um dia fácil.

É esse sentimento de ser “passada para trás”, de certa humilhação, que Es Muss ( Deve ser, em tradução) transmite muito bem. Sylvia parece um tanto deslocada no seu trabalho, por exemplo, um ambiente moderno, e ela com ares de vovó. Todas as pessoas que a colocam em posição humilhante são também mais novas que ela, e bem na hora em que a protagonista está na situação, alguém passa por ela, a encarando, e os diretores Flávio Luca Mariano e Jumana Issa fazem questão que esse olhar seja sentido.

Nota: 4/5

Next Picture

Next Picture começa com imagens, aparentemente, puramente de registro. Pessoas andam por uma calçada em frente a um cinema, camelôs tentam vender seus bens, um dia qualquer. Mas esse cenário é interrompida por mensagens na tela, homens buscando outros homens, de modo ávido, incessante. É um desejo intenso, mas que deve ser mantido em segredo, e o curta filipino trabalha muito bem esse “espaço secreto” de homens gays a partir do contraste entre as palavras e as imagens.

Nota: 3,5/5

Esse texto é parte da cobertura do 74ª Festival de Locarno

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