Crítica – 2020 Nunca Mais

2020 foi um ano ruim, essa é uma afirmação que, mesmo para aqueles que pessoalmente passaram o ano bem, é difícil de discordar. Começou com ares de III Guerra Mundial, água suja para os cariocas e logo o coronavírus fez o mundo parar, mesmo que alguns – como o presidente Brasileiro e o americano – fizessem de tudo para diminuir a gravidade da situação.A realidade se impôs, e o fim do ano chega com quase dois milhões de mortos. Somado a isso, a morte de George Floyd também marcou o ano, assim como os protestos que resultaram deste evento.

Mesmo em um ano tão caótico, as piadinhas nunca pararam, e uma das principais é “imagina ter que fazer a retrospectiva desse ano”. Bem, foi exatamente o que o criador de Black MirrorCharlie Brooker, se dispôs a fazer com 2020 Nunca Maisum documentário satírico sobre o ano que passou, contanto com uma série de estrelas interpretando especialistas de diversas áreas, ou somente pessoas comuns. No elenco temos Samuel L. Jackson, Hugh Grant, Lisa Kudrow, Kumail Nanjiani, Joe Keery e narrado por Lawrence Fishburne.

Além do elenco, outra parte da equipe também é vasta, a dos roteiristas, que, sem contar com Brooker e Annabel Jones, os criadores da empreitada, conta com nada menos que dezoito nomes creditados. Até faz sentido quando se pensa na quantidade de eventos relevantes que ocorreu no ano, mas nenhum sentido quando se de fato assiste ao trabalho, já que ele consiste em basicamente as mesmas piadas que você ouviu durante praticamente o ano todo – mas agora ditas por pessoas famosas e não perfis no twitter com foto de anime.

Assim, além de uma retrospectiva dos eventos do ano, 2020 Nunca Mais também é uma retrospectiva das piadas típicas para cada mês ou situação. Gracinha sobre o coronavírus ter vindo de morcegos? Temos, sobre influenciadores sem noção? Também, bilionários de tecnologia sem noção da realidade? Pode apostar. A personagem de Lisa Kudrow consiste inteiramente em fazer piada sobre a característica da administração Trump em negar a realidade, como se ninguém soubesse disso, enquanto a de Leslie Jones se baseia unicamente em ser uma psicóloga que odeia pessoas. Essas duas personagens, inclusive, contam com a mesmíssima piada sobre ter livros cujo título seja uma de suas declarações. O que poderia servir como ponto de partida para algo interessante é, na verdade, tudo que o longa tem a oferecer, nada nunca saí de “2020 foi ruim viu gente” ou elabora nenhuma das suas afirmações extremamente básicas.

E pior, mesmo sabendo o quanto a postura anti-ciência foi responsável pela nossa situação atual, Brooker não se furta de colocar em cena o velho adágio de “ciência é chato”, já que quando um dos personagens, o cientista chamado Pyrex Flask (não posso enfatizar o bastante o quão raso é o filme), interpretado por Samsom Kayo, começa a explicar as logísticas do vírus e da vacina, Brooker acha por bem cortar para imagens “mais interessantes” para não entediar a audiência. No fim disso, a grande piada é, quando o cientista pergunta se ele não se importa com isso, Brooker, que interpreta o diretor por trás das câmeras, diz “não”.

2020 Nunca Mais só existe para capitalizar no zeitgeist da pior maneira possível, é preguiçoso e sem imaginação, e acaba sendo uma síntese do que foi esse ano, pois é igualmente péssimo e eu gostaria de esquecer que existe.

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