Crítica – A Batalha da Rua Maria Antônia
A Ditadura Militar Brasileira é marcada por diversos pequenos momentos e acontecimentos que ficam desaparecidos em meio à História geral. Se, em muitas ocasiões, falamos sobre o AI-5 ou uma mudança de general na presidência, acabamos deixando de lado episódios como a Greve do ABC, por exemplo. Um desses grandes momentos do período entre 1964 e 1985 é a Batalha da Maria Antônia, que ocorreu em 1968. Esse que foi um conflito entre estudantes de filosofia da USP e da Universidade Mackenzie, que ficavam frente a frente. Enquanto a primeira era dominada por um movimento estudantil, a segunda convivia com uma ajuda do CCC, ou Comando de Caça aos Comunistas, que eram financiados pelos militares.
Todo esse pano de fundo é fundamental para entender a forma como A Batalha da Rua Maria Antônia vai compreender a ebulição desse confronto. Apesar de ser o título, ele é apenas a consequência de tudo que o filme irá buscar, ou seja, a forma como as coisas chegaram até ali. A tensão crescente é fundamental e, por isso mesmo, a diretora Vera Egito estabelece um ambiente em que qualquer coisa pode acontecer. No entanto, aqui há um lado bem claro, contra o regime. Apenas a visão dos estudantes comunistas é contemplada.
Para constituir essa tensão, a direção tenta trabalhar tudo como se fosse em tempo real. Em uma forma de buscar uma naturalidade desses fatos e da maneira como eles se desenrolam, Egito estabelece o longa dividido em 21 partes, todas elas feitas em planos-sequência. Além disso, a utilização do preto e branco como uma espécie de retrato de uma época fortalecem a ideia de uma defesa do que realmente aconteceu em um tempo. Só que a diretora quer trazer uma espécie de resposta para o período ditadorial. Em vez dessa demonstração da “realidade” e quase documental ser por uma visão censurada, ela pode ter também a visão dos comunistas e estudantes de filosofia da história.
A Batalha da Rua Maria Antônia se concentra em diversos personagens que compõem um universo geral, todos que tem um devido espaço. Desde um estudante líder do movimento, até uma aluna que não quer se envolver nesse conflito, chegando a uma professora totalmente alienada ao que está acontecendo. São pequenos personagens fundamentais de uma trama maior, que já é renegada pela historiografia. A cineasta busca deixar essas vozes em evidência.
O problema é na forma como elas se tornam até mesmo em uma evidência maior do que a própria narrativa em si. Ou seja, o filme vai dando cada vez mais espaço para pequenas personalidades que, no fim das contas, soam como vazias e até meio esteriótipos. Isso se deve ao simples fato de que não haverá tempo suficiente para todos terem um desenvolvimento aprofundado, já que há algo maior sendo retratado. Ao mesmo tempo que busca tirar o silêncio das pequenas vozes de algo maior, acaba as tornando meio inócuas, quase as desenvolvendo para não chegar a uma resolução. Isso fica evidente na maneira como todos os professores são retratados, por exemplo.
De toda forma, Vera Egito reconstitui esses acontecimentos em “tempo real” para A Batalha da Rua Maria Antônia quase como uma forma de transportar essa história para os tempos atuais. Em um momento que as grandes manifestações não são apenas vividas, mas também transmitidas em todas as redes sociais, é como se a diretora buscasse transmitir isso para esse momento histórico. A câmera, sempre correndo, reforça um olhar de uma atenção extrema e que não pode se desligar em momento nenhum. Assim como os estudantes naquele dia de 1968. Eles precisaram gritar também e não desligar, afim de que esse momento nunca fosse esquecido.
Essa crítica faz parte da cobertura do Senta Aí do Festival do Rio 2023