Crítica – BlackBerry
Talvez se você se interesse minimanente por tecnologia e smartphones, já que tenha se feito a seguinte pergunta: onde diabos estão os BlackBerrys? Um dos aparelhos de maior sucesso quando foi publicado, no fim dos anos 1990, e que simplesmente, no decorrer dos anos, desapareceu no tempo. O mais incrível é que, dentro do mercado tecnológico nos Estados Unidos, esses smartphones já tiveram uma dominância de simplesmente 75%. Hoje em dia, eles estão em menos de 0% no uso no país. Por que?
Parte dessas questões são explicadas e debatidas no filme BlackBerry, que segue uma tendência do ano de 2023 de contar histórias relacionadas a produtos. Só que, diferente dos outros, o caso daqui talvez seja mais impactante, pelo fato de ter sido uma jornada de subida e queda igualmente repentinas. De aparições em gigantescos programas televisivos ao ostracismo. Essa metamorfose ambulante, como diria a música de Raul Seixas, é retratada com menos detalhes do que poderia, mas de forma concreta aqui.
O longa tem uma clara ideia de tentar tecer um comentário sobre a indústria tecnológica dos anos 2000 – algo que é feito de forma bem forte também em Steve Jobs, de 2015. Porém, se lá há uma figura central, aqui essa centralidade aparece mais nos conceitos, que todo o time de desenvolvimento de programação da BlackBerry realiza. Não a toa, a direção de Matt Johnson constrói um universo de união, conversas e brincadeiras entre eles, para reforçar essa ideia de um grupo. Todo esse mundo comandado por Mike (Jay Baruchel), a única figura que não é dimensionalizada na trama.
Aliás, se Johnson consegue determinar muito bem esse microcosmo de seus personagens nas relações entre si, o mesmo não pode ser dito para as construções dramáticas dos mesmos. Ao precisar falar de muitos, parece que todos se tornam uníssonos, quase caricatos em uma opinião única. Em certo ponto, até faz sentido essa perspectiva da direção, especialmente por buscar trilhar um caminho feito por diretores como David Fincher e Adam McKay – algumas sequências soam quase como uma cópia de A Grande Aposta, por exemplo.
O maior problema de BlackBerry se concentra no fato de precisar contar uma história trágica sem nenhuma base para isso. Ou seja, sem seus personagens destacados ou até mesmo uma consolidação no entorno do produto. Parece uma grande rememoração de outros filmes de sucesso similares, que buscam trabalhar a ideia dos homens com grandes ideias, mas cheios de problemas. Porém, se o que sobrava nesses outros era a defesa de uma ideia, aqui nem isso aparece direito.
Por isso tudo que BlackBerry é uma produção mais perdida do que deveria, visto que possui até uma grande “base”, por assim dizer. Entretanto, é um longa que não sabe bem em qual caminho vai se encaixar e até mesmo qual gênero vai querer explorar, visto que em algumas partes vai para uma comédia mais escrachada e em outras em um drama vazio. No fim das contas, parece mais uma grande cinebiografia, mesmo não sendo diretamente uma. Quer dizer, até é, de um celular.