Crítica – O Debate
O cinema de ficção tem uma certa dificuldade se atrelar muito ao momento político de cada um dos países. E isso por um fato bem claro: já que ele precisa do decorrer dos acontecimentos para criação de alguma história ou ideia por parte dos realizadores. Assim, os documentários, normalmente, costumam conseguir serem mais “quentes” neste sentido, em transmitir com muita atualidade tudo que está acontecendo. Apesar disso, O Debate, primeiro trabalho na direção de um longa de Caio Blat, busca ser muito completo em transmitir o atual período político brasileiro. Ele também deixa bem claro seu lado, quase se transformando em uma propaganda sem citar nomes.
Para isso, o filme baseia sua trama na história de um casal em meio ao dia do último debate para disputa do cargo de presidente no segundo turno. O nome dos candidatos não são citados (apenas Presidente e Ex-Presidente, deixando às claras que se tratam de Lula e Bolsonaro). Nesse ambiente, acompanhamos uma discussão ideológica e de uma perspectiva ética de Marcos (Paulo Betti) e Paula (Debora Bloch). O primeiro é editor-chefe do jornal que transmite o debate e a segunda apresentadora do jornal noturno da emissora. Dentro dos embates e pensamentos do casal, se busca fazer um apanhado dos últimos dois anos do país, ao mesmo tempo que como isso tudo complexificou a relação deles.
As boas ideias de Blat em construir sua narrativa como espelho terminam simplesmente no campo das ideias mesmo. Isso porque ele não esconde em instante algum todo o olhar teatralizado da história, seja pelos pequenos espaços nos cenários, seja pela intensidade nas interpretações. Assim, deixa todos os acontecimentos apenas pela visão do roteiro, escrito por Jorge Furtado e Guel Arraes. Há uma clara tentativa de soar como algo muito maior em um ambiente enclausurado (como feito por Roman Polanski em Deus da Carnificina, por exemplo), o que é denotado pelos contrastes entre o escuro e claro, especialmente.
O Debate é uma obra que busca a todo momento querer ser claro nas referências. E isso parte desde esses direzes diretos e indiretos dos candidatos a presidência da república em 2022, até mesmo pela forma como coloca uma cena de Os Normais em uma sequência dentro de casa do casal. Os simbolismos todos querem parecer óbvios demais, trazendo pouco espaço para alguma visão narrativa no meio disso. É um filme que parece querer se basear muito no exterior e no olhar com que o público vai olhar para os acontecimentos. Desse jeito, ele perde na própria essência e em ser quem ele é, em contar algo.
Além disso, é uma produção que está a todo instante em contato com suas contradições temáticas, mas que nunca sabe bem como respondê-las. Um dos exemplos mais claros disso é o próprio Marcos, que representa uma voz dissonante de Paula na cobertura política. Ele, em certos momentos, é quase uma voz do povo, de que certas pessoas discordam. O problema é que, em cena alguma, essa discordância ética aparece, já que o personagem, no fim das contas, concorda em tudo com a apresentadora. Desse jeito, é como se sempre estivesse andando em círculos e falando a mesma coisa, sem saber muito bem como explorar ela.
Caio Blat até tenta estilizar, de alguma forma, uma narrativa completamente vazia. O Debate talvez tenha bons momentos (como a cena inicial e o diálogo após o debate), mas soa como um produto com uma intenção muito clara e, assim, não sabe como abordar nenhum tema que propõe. Tenta não ser inteiramente zerado das discussões, já que traz toda uma política atual brasileira, só que gosta mais de trazer frases de efeito do que realmente ser algo além disso.