O jogo de ilusões em Homem-Aranha: Longe de Casa

Após ter começado sua participação no Marvel Studios em Capitão América: Guerra Civil, Peter Parker (Tom Holland) parecia muito perdido. Confuso com sua identidade e sobre como ser herói principalmente, algo explorado com mais detalhes em Homem-Aranha: De Volta ao Lar. Ele enfrenta tudo isso sobre si mesmo ao aprender a trabalhar em equipe durante Guerra Infinita e Ultimato. É o seu momento ápice com nova personalidade, aprendendo esses desafios na prática, ainda que de forma traumática. Em Homem-Aranha: Longe de Casa, vemos um personagem com maior conhecimento sobre si mesmo. Ao passar uma viagem de férias na Europa, entretanto, ele colocará tudo isso em prova, pelo simples fato de enfrentar as ilusões do mundo contemporâneo.

O diretor Jon Watts, o mesmo de De Volta ao Lar, sabe muito bem ressignificar os diversos personagens secundários. Ned (Jacob Batalon) e Betty (Angourie Rice), por exemplo, sofrem efeitos diversos sobre o sumiço após o estalo de Thanos. A escola tem uma nova integração e possui questões internas, especialmente pelos que ficaram e os que sumiram. Watts se propõe a divagar sobre um microambiente, que afeta diretamente a vida de Peter. Apesar de rápido, esse instante inicial serve para uma observação sobre sua personalidade, agora menos comedida e um pouco mais ativa. Tudo acaba sendo centrado na ideia dele de aproveitar as férias para declarar seu amor por MJ (Zendaya).

Apesar desse lado mais propositivo – até em relação ao humor -, a encenação do longa rememora esses fiapos deixando na vida do Aranha. Ele, mesmo tendo enfrentado tudo, ainda se vê como menor e não sabe lidar com isso. Toda a cenografia reforça uma memória de Tony Stark, sobretudo em um lado do simbolismo representado por esse. Os desenhos nas paredes, as aparições na televisão e até mesmo conversas banais demonstram uma necessidade intrínseca de Peter crescer como herói. Esse fato demora a aparecer diretamente na trama, apesar de ter sua devida relevância. Quando ele acontece, é uma percepção mais clara dessa coesão em torno da linha do tempo do protagonista.

O vilão Mysterio (Jake Gyllenhaal) acaba elevando o tratado temático e dramático da produção. Em relação ao primeiro, ele aparece como um personagem criado da ilusão e exercendo sua força a partir dela. Nesse instante diversas de suas frases (“um herói de ilusão em um mundo da ilusão”) reforçam um certo eixo do tema sobre a era da pós-verdade. É um personagem baseado em criar uma gigantesca mentira sob outras mentiras, gerando assim uma simples conexão com a própria sociedade. Se todos agem dessa maneira, inclusive presidentes, porque não gerar heróis assim? Nisso, todo o seu teor dramático é sobreposto em buscar uma voz própria, tentando lidar com as frustrações. Até rememora um pouco o Síndrome, de Os Incríveis.

Nessa questão, há uma enorme perda para o arco principal na questão do drama. Parker pouco aparenta ter algo realmente próprio a conseguir. Mesmo tudo sendo colocado a prova, ele acaba agindo de uma mesma forma, algo muito colocado pelo roteiro. Chris McKenna e Erik Sommers até colocam alguns questionamentos – como dito acima -, todavia isso fica pouco relacionado a ele próprio. Acaba que, por conta de um envolvimento sobre o antagonista, seus dilemas são renegados a um enfrentamento. Existe até uma tentativa de criação disso sobre seu relacionamento com MJ, contudo é deixado em pontas e concluído rapidamente. O arco serve apenas ao mesmo enfrentamento detalhado anteriormente.

Apesar de pecar em desenvolver um drama maior, Homem-Aranha: Longe de Casa sabe como divertir. Ao brincar de diversas formas e jeitos com a ação durante o filme, principalmente pela amplitude de situações nas ilusões, o longa encontra espaço nisso para trazer o público. Acaba sendo um final interessante e mais direto, para o fim da fase três da Marvel, do que propriamente algo gigantesco como Ultimato. Quando acerta ao abordar de maneira um pouco aleatória seu tema, Jon Watts coloca um certo espírito jovem na narrativa. Isso não funciona apenas internamente, mas gera os pontapés inicias ao futuro do personagem. O que é verdade e mentira? Até que ponto é possível provar as coisas? Nisso, podemos imaginar os enfrentamentos do mundo na atualidade, assim como de Peter Parker no futuro.

Comentários

Cláudio Gabriel

É apaixonado por cinema, séries, música, quadrinhos e qualquer elemento da cultura pop que o faça feliz. Seu maior sonho é ver o Senta Aí sendo reconhecido... e acha que isso está mais próximo do que se espera.

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