“O racismo está vivo e bem. É uma ferramenta usada para roubar, explorar e se beneficiar do progresso, sabedoria e conquistas de outros”, diz protagonista de Fogo Contra Fogo
Quando se pensa no Apartheid na África do Sul, o primeiro nome a aparecer é sempre o de Nelson Mandela. No entanto, existiu um submundo pouco retratado na história e cultura mundial que foram os revolucionários ante o racismo no país. Uma dessas figuras foi Solomon Kalushi Mahlangu, um simples vendedor ambulante que acaba por ser atraído para o movimento de libertação do povo negro. Ele e seus companheiros acabam sendo capturados pela polícia em uma missão, tendo, assim, de lutar pela sua vida no tribunal racista do país. Essa é história contada por Fogo Contra Fogo, que estreia nesta quarta (dia 20).
Kalushi nasceu em Pretória, capital administrativa da África do Sul, em 1956. Sua morte foi prematura, logo em 1979, com 22 anos de idade. Sua luta política aconteceu no Umkhonto we Sizwe, mais conhecido como MK. Ele era o braço armado e revolucionário do partido African National Congress. A vida como militante durou muito pouco, sendo inicializada em 1976 – com um refúgio para Moçambique – e sua prisão posterior, logo em 1977.
“Interpretar Solomon foi uma jornada de descobertas. Eu o descobri e sua história a partir desse papel”, conta Thabo Rametsi em entrevista ao Senta Aí. Ele interpreta Solomon, ou, como é mais conhecido, Kalushi, título do longa fora de terras nacionais. “Para mim, ele representa as muitas pessoas comuns que se levantam contra a injustiça. Celebramos a vida dele e as muitas outras que contribuíram para a luta pela liberdade através das histórias que contamos sobre elas.”
A partir dessa trama base, vemos a história de vida desse homem bastante desconhecido pelo grande público. A alternância da produção, dirigida pelo diretor sul-africano Mandla Dube, em sua estreia na cadeira de direção e roteiro, se dá entre suas ações passadas e o julgamento no tribunal. Há um interessante olhar dentro da obra para os pequenos detalhes e como aquela estrutura racial era colocada em cada uma das relações sociais. Um exemplo disso é o jazz, um subterfúgio para o protagonista, ao mesmo tempo que uma resistência da música negra.
Para Rametsi, fazer esse filme na atualidade “é a coisa mais triste de tudo”. Mas não em um sentido de algo ser ruim, porém sim da necessidade do debate racial ainda estar tão presente na sociedade.
“Todas as coisas contra as quais ele e seus companheiros lutaram nos anos 70, ainda eram em 2017 [quando o longa foi lançado fora do Brasil], e ainda são relevantes hoje. As pessoas ainda estão sendo oprimidas pelos governos, grupos de ódio e ideologias de outras pessoas. O filme é sobre amor. Amor por si mesmo e pelos outros. Esse ainda é um ponto de partida relevante para a mudança”, relata.
Ele ainda retrata que não “teve um julgamento ou opinião sobre o personagem”. Sendo assim, a posição histórica tida por Kalushi não pesou tanto sobre seus ombros. A busca do ator era mais uma humanidade dentro desse persoangem, algo onipresente nos humanos. “Simplesmente interpretei um rapaz, um amante, um filho, um amigo, um irmão, um compatriota e isso não é difícil, simplesmente exige honestidade”, diz.
Acima de tudo, Fogo Contra Fogo fala sobre racismo. Uma história individual, todavia que é conectada a de diversos negros ao longo da vida humana, inclusive na contemporaneidade. Não a toa, casos acontecem em estádios, por exemplo. Torna-se impossível dissociar, assim, o racismo das relações humanas e sociais. Ele representou e representa uma realidade, por isso a importância do Dia da Consciência Negra, no último dia 20. Aliás, a data foi a escolhida pela distribuidora, a Elite Filmes, para lançar o filme em terras nacionais.
“O racismo está vivo e bem. É uma ferramenta usada para roubar, explorar e se beneficiar do progresso, sabedoria e conquistas de outros”, continua Thabo. “uando as pessoas fracas não podem ser ou fazer algo especial, elas roubam daqueles que podem e recebem crédito por isso. Eles menosprezam aqueles de quem roubaram e negam ter roubado alguma coisa.”
O ator ainda faz um discurso sobre a importância da história de Salomon nos dias atuais. A relevância do debate ultrapassa fronteiras específicas e mínimas. Ele passa a ser, segundo Rametsi, de um enfrentamento contra as opressões.
“Espero que inspire os oprimidos a lutar e nunca parar. Nunca deixe as pessoas te oprimirem novamente! Sua liberdade é sua, pegue!”