Vingadores: Ultimato e o peso do passado

Esse texto contém spoilers de Vingadores: Ultimato

É possível dizer que o épico se iniciou no cinema com D.W. Griffith, principalmente com Intolerância (1922). Tudo continuou com o faroeste, mostrando heróis e construção do mito no meio da formação dos Estados Unidos. Anthony Russo e Joe Russo retomam isso em Vingadores: Ultimato. A mitologia americana sobre a identidade do passado e esse peso histórico agora faz parte dos heróis. E é fato a ideia dos próprios heróis serem essas figuras formadoras de uma identidade. Por isso, o peso do passado é a coisa mais importante para o filme, na qual busca entender o quanto isso se faz necessário ao fracasso dos personagens.

Na trama, os Vingadores estão de mãos atadas após perderem a batalha com Thanos (Josh Brolin) em Vingadores: Guerra Infinita. O universo está em ruínas e a chegada de Capitã Marvel (Brie Larson), além do retorno de Scott Lang (Paul Rudd), representam uma esperança ainda da luta contra o vilão. Só que, para desfazer tudo, eles deverão voltar ao tempo e conseguir as jóias antes de ser tarde.

É interessante como toda a encenação propõe uma primeira hora totalmente dramática. A aceitação da derrota, o luto, o peso do fracasso, tudo faz parte desse novo instante da vida dos personagens. Os planos – quase sempre muito próximos ao rosto – demonstram essas rugas se sofrimento. Tony Stark (Robert Downey Jr.) é talvez quem mais revele isso, ao mandar uma mensagem para Pepper Potts (“Parte da jornada é o fim”) e na conversa com o Capitão América (“Eu perdi o garoto”). Toda essa rachadura se expressa em diversos períodos ao longo da narrativa, sendo um fardo necessário de ser alterado. Não a toa, o personagem seja necessário para estalar o dedo ante o antagonista no fim. Ao remeter a frase primordial em Homem de Ferro (“Eu sou Homem de Ferro”), ele configura esse passado para dar futuro a Terra.

Entretanto, não é apenas com Stark que essas questões se apresentam. Todo esse pretérito é uma potência para seguir em frente. Perceber seu lugar na história é o fator quase de existência dos heróis. Capitão aceitou ao longo dos anos a perda da mulher amada, por isso precisa buscar esse tempo perdido ao fim. Ele é o mais próximo de um protagonista dentro da obra, pelo simples fato de representar toda essa ideia patriótica americana. As suas cores e o escudo retomam com força aqui, além da demonstração de sua potência por portar o martelo.

Os dois personagens – protagonistas, assim dizendo, desse universo da Marvel – agora precisam descansar. Enquanto um sofre um ato traumático, o outro envelhece. Os heróis, construídos ao longo de 11 anos nos cinemas, agora se deixam levar pelo tempo. Toda essa construção anterior, suas trajetórias, nunca serão esquecidas. É impossível de esquecer, até por serem os mais importantes durante a produção. Eles representam toda a ideia do time clássico dos Vingadores, que ainda aparecem em determinado momento da viagem no tempo, agora deixados em um tempo distante (algo salientado pelos anos mostrados nesses lugares).

Fica quase possível dizer que o futuro tem sua voz atuante no ato final. No instante que Capitão grita “Avante Vingadores”, demonstra a transformação de um grupo, uma família, em uma ideia. Agora os novos personagens (Capitã, Pantera Negra, Homem-Aranha, Doutor Estranho) tomam o lugar. Aparecem como salvadores dentro de uma batalha marcada pelas alternações entre o grandiloquente e o interior, com planos abertos e closes. É a percepção dessas pequenas vozes dentro de um conceito representado pelos que vingam. Na cena em que todos trabalham em conjunto isso se mostra ainda mais presente, na necessidade de cada um depender do outro. Essa equipe, formada pela diversidade, pega o bastão passado após todo esse tempo.

É o fim de uma era, se isso pode ser dito. Vingadores: Ultimato é um filme que gosta de celebrar essa era passada, olhando para esse peso do tempo na construção das figuras mitológicas. Assim como Shazam!, deuses, religiões, crenças e a história agora acabam sendo vistas por heróis. Frágeis, fracassados, sem saber o porque de fazer isso, não sabendo fazer seu designo ao nascer. Os irmãos Russo olham na sua direção para o presente, para a atual identidade americana. O cinema, na qual sempre representou todo esse medo e empolgação perante ao futuro, é agora parte do presente também. As imagens heroicas fazem parte da história humana. E os super-heróis agora, se tornam apenas heróis. Enquanto os antigos deixam o tempo os tomar, os novos olham para o futuro, lembrando do passado.

Comentários

Cláudio Gabriel

É apaixonado por cinema, séries, música, quadrinhos e qualquer elemento da cultura pop que o faça feliz. Seu maior sonho é ver o Senta Aí sendo reconhecido... e acha que isso está mais próximo do que se espera.

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