I Am Mother e as criações e recriações
A maternidade já foi explorada das mais diversas formas dentro do cinema. Isso é ainda mais potenciado dentro da ficção científica. Desde Alien, o Oitavo Passageiro até, mais recentemente, Gravidade, o gênero gosta de falar sobre nossa relação de nascimento. Em I Am Mother, vemos uma figura materna na trama associada à uma robô. Após desastres terem extinto toda a população, alguns embriões acabam sendo mantidos em criogenia para crescerem futuramente. Uma menina (Clara Rugaard) acaba sendo a primeira com o objetivo de repopular a Terra, sendo criada em espaços totalmente confinados pela mãe robô (Rose Byrne). O problema é o aparecimento de uma outra mulher (Hilary Swank), que acaba deixando dúvidas sob a cabeça da menina. Não apenas das intenções dos robôs, mas do papel materno.
Um interessante lado nessa questão do eixo temático do longa está centrado na fala sobre criação e recriações. Isso ultrapassa um simples conceito filosófico e adentra questões de inteligência e um entendimento de quem somos. Ainda mais, a personagem de Rugaard não se questiona sobre sua criação em momento algum. Ela até tem um vislumbre dos outros humanos congelados e não desenvolvidos, porém seu preceito humano básico não parece ser desenvolvido. Claro, pelo fato do controle do robô, contudo, é interessante pensar nas escolhas narrativas desses pensamentos da menina na direção de Grant Sputore. Ele busca olhar essa protagonista sempre confusa nesse meio, mas usando mais planos fechados em suas expressões e não tanto na maneira que os espaços cênicos propõem isso.
Dentro ainda desses conceitos, toda a ideia moral sobre a criação só aparece mesmo quando a personagem da mulher desconhecida entra em cena. A grande problemática é que, a partir daí, a obra perde sua força ao debater essa concepção de forma menos direta. Obviamente, há até uma tentativa da direção ao encenar bem mais um jogo de verdades e mentiras, remetendo a um trabalho de suspense mais claro. No quesito de nunca ser claro quem está mentido e quem está dizendo a verdade, os planos subjetivos na protagonista jogam de frente essa dúvida no telespectador. Entretanto, quando tudo fica mais claro, o roteiro – de Sputore – e a montagem – de Sean Lahiff – deixam a subjetividade de lado para adentrar em uma história mais focada na ação. O problema não é o acontecimento dessa quebram todavia seu feito abruptamente.
Isso acaba por corroborar uma perda no debate de maternidade. Apesar do filme ainda querer deixar isso como sua alegoria principal (algo proposto especialmente na última cena), ele se perde ao buscar abordar isso em uma obrigação feminina. Explora em preceitos mais críticos, colocando até as mulheres sendo um último refúgio humano por realizarem a criação. Não deixa de ser interessante a personagem da Mãe robô querem ser super cuidadosa e se importar mais com um desenvolvimento controlado da “filha” e nem tanto deixando uma liberdade sobre suas escolhas. Grant Sputore coloca isso sempre em centro dos planos mais abertos, olhando o corpo de suas atrizes. O uso não é de uma sensualização, porém de exploração dessa germinação.
Com essas correlações em jogo, a obra acaba ficando repetitiva em seu terço final. Aliás, os confrontos dramáticos de uma confusão sobre o eu acabam colocando mais espaço para cenas de diferentes ângulos na primeira hora do que no resto. Alguns quesitos, como toda a explicação da personagem de Swank, servem apenas de uma exposição barata a dar um mesmo ideal. Não há contraponto dentro de uma narrativa que abriu esses contrapontos e dualidades da consciência desde os primórdios. Parece haver uma perda de um sentido próprio, por uma simples necessidade básica de ação generalizada.
I Am Mother sabe bem como colocar seu debate temático principal sobre a acepção materna. Ao explorar as mais diversas personagens sob mais diversas camadas e facetas físicas, a obra demonstra claramente a tensão estar em todas. Se, pela robô, essa tensão vai pelo caminho da criação ‘correta’, para a protagonista aborda de renascimento da vida. São as criações e recriações da vida e também da humanidade. Tudo passa por um papel simples e excluído do debate público em muitas ocasiões. Tudo isso se relaciona ao papel das mães. Nelas, há uma responsabilidade, mesmo que deixadas totalmente isoladas, independente da condição. E, assumir e ter esse lugar como obrigatoriedade, mostra a pressão social por todas as partes.