A efemeridade da morte em A Floresta das Almas Perdidas
Logo em seu início, A Floresta das Almas Perdidas já nos leva a diversos questionamentos acerca da morte e da efemeridade da vida. Por que nos importamos tanto com coisas materiais e mundanas? Por que nos importamos com o suicídio? E qual o nosso real papel aqui? Por que pensamos nisso tudo? Bom, ao abrir sua forma em um lado mais filosófico, entendemos os aspectos humanos no longa, na conversa em que Ricardo (Jorge Mota) quer se matar e Carolina (Daniela Love) parece atiçar ainda mais essa angústia. Essa relação acontece em uma floresta, um ambiente propício a ouvir bem pouco o vazio interior, algo na qual os personagens parecem pouco sentir.
O diretor José Pedro Lopes constrói sua encenação baseada, nesse primeiro momento, em uma reflexão do público para com seu universo mostrado. Ele se utiliza de planos muito abertos, misturando a fotografia em preto e branco de Francisco Lobo, dando uma catarse de melancolia a volta. Os personagens são pequenos, efêmeros, a morte parece ter muita pouca relevância nesse meio. É quase uma construção bem da antítese de Ingmar Bergman. Enquanto esse segundo salienta o silêncio de Deus perante a mortalidade humana pelas expressões “perdidas”, o primeiro se preocupa na opressão do ambiente, trazendo quase um sufocamento visual a cada nova sequência.
Apesar de salientar esses elementos de uma tristeza tão profunda que quase pode se criar piada com isso (as cenas de Carolina na floresta salientam bem esse ponto), essas questões se tornam excessivas dentro dos diálogos feito pela dupla. Há uma certa repetição temática dentro de conceitos filosóficos, ao repetir autores e salientando uma certa ode popular – visto a citação da floresta de suicídios no Japão. Mesmo sendo algo esquecido na segunda parte da produção, esses pequenos elementos tornam a trama um tanto quanto inchada e rasa em relação aos seus significados.
A segunda parte do longa se assume como um terror mais direto, bem menos trabalhado dentro da própria ambientação. Nesse instante, José gera na sua mise-en-scéne um contraponto bem clássico. Agora, se utiliza uma linguagem até bem aproximada de um cinema hollywoodiano, manipulando a tensão através da profundidade de plano. Se podemos traçar um paralelo claro é a elucidação do medo feita por boa parte da carreira de John Carpenter, especialmente em Halloween. O público sempre está a frente dos personagens quanto aos ataques, salientando também como o homicídio, além do próprio suicídio, são idealizados em uma efemeridade da vida, quase como se fossem passageiros. Se, inicialmente, observamos o desespero do pai para tentar deixar um legado a família, agora vemos uma resposta para isso, porém sob o efeito da morte nunca acontecer, como salienta a constante repetição sobre aonde estaria o pai.
Essas matérias servem de um perfeito material a uma até ironia da montagem feita pela película, em brincar com um pensamento do conceito da morte. Ao ponto dessa poder ser tão banalizada pela nossa sociedade – a matança final em um ambiente da cidade revela isso – e se tornar propriamente comum. São praticamente duas obras em uma, criadas sob a forma de obversas uma mesma perspectiva do tema, mas em diferentes pontos de vista. Por isso, o fio condutor da narrativa feito por Carolina, mesmo não sendo a principal dentro do arco, é tão importante. Ela é a tradução dos olhos que vêem tudo, da observação e da bizarrice da catástrofe mundana. Sua frieza é tão grande que ela pode debochar de um suicida e matar de forma violenta. É uma idealização quase estereotipada de uma característica humana.
A Floresta das Almas Perdidas é um ótimo trabalho de estreia com longas do diretor José Pedro Lopes. Apesar de soar repetitivo para com sua abordagem temática dentro de suas 1h11 minutos, é um filme pautado pela construção narrativa de uma sociedade banalizada pela morte. Por isso, o uso do horror se torna tão importante dentro do andar do enredo, como um elemento cênico de um medo social constante, ao mesmo tempo que uma ironia dos tempos, na qual a morte parece tão efêmera quanto existir.