Crítica – 892

Para quem, como eu, não conhece a história real de Brian Brown-Easley, o número que dá título a produção, 892, é um mistério a ser solucionado. Parece uma cifra aleatória, quando o momento em que descobrimos a motivação por trás dessa escolha acontece, soa absurdo que este tenha sido o pontapé por trás dos eventos do filme. Durante uma conversa com o negociador Eli (Michael Kenneth Williams), Brian (John Boyega) conta que um cheque de seu benefício de veterano foi extraviado e que a instituição responsável por resolver o caso não o ajuda, o valor do cheque? 892 dólares e alguns centavos.

É a falta do valor, irrisório diante de tudo que os Estados Unidos gasta nas guerras que cria veteranos traumatizados, que coloca a vida de Brian Brown-Easley na beira do precipício. Sem essa quantia, ele seria expulso do hotel que vive, e não teria nem como arranjar comida. Seus constantes pedidos de ajuda não levam a lugar algum. Desesperado, ele acorda uma manhã, se dirige a um banco próximo, e informa a caixa que ele possui uma bomba, e que irá explodir a todos ali se suas demandas não forem atendidas.

892, dirigido por Abi Damaris Corbin, é praticamente filme de uma só locação, explorando a tensão e drama da situação por meio de imagens e movimentações nervosas, com uma paleta de cores opressiva, formada por azuis escuros e tons de preto, mas eventualmente somos levados para fora do espaço do banco, para que o fracasso institucional que levou Brian a essa situação seja explorado. Vemos suas constantes visita ao Centro de Veteranos, tentando reaver o dinheiro que é seu por direito, assim como a humilhação de ter sido expulso do local, quando sua angústia chegou ao limite. 

É a atuação de Boyega que sustenta muito do filme, evocando um homem frágil, derrotado pela vida desde o primeiro momento que vemos, com expressão perdida, olho roxo e ombros caídos, porém cujos traumas na guerra deixaram seu humor instável. Ao mesmo tempo que é terrivelmente educado com suas duas reféns, Estel (Nicole Beharie) e Rosa (Selenis Leyva), a menor frustração o transforma em um homem paranóico e impaciente, gritando para que elas fechem todas as portas repetidas vezes.

892 é um filme que se expande conforme a narrativa se desenrola, explorando a profundidade da falha que gerou aquela situação, um pesadelo para todos os envolvidos, e falha também durante a situação. Um problema de burocracia levou Brian a fazer o que fez, e similarmente é a burocracia que leva a sua desnecessária morte, por meio do disparo de um sniper que ninguém sabe de onde partiu.

A reação inicial ao longa o demarca como uma espécie de thriller, o que por mais que faça sentido diante da história, perde um pouco do que a história deseja contar. 892 é um drama, sua resolução não oferece qualquer espécie de alívio a nenhum dos envolvidos. Após o tiro que marca o fim da vida de Brian, nada é comemorado, e sim observamos o silêncio e confusão de quem acompanha a situação, que nunca deveria ter chegado onde chegou, nem ter tido essa conclusão tão trágica.

Texto para nossa cobertura do Festival de Sundance 2022

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