Crítica – Favela é Moda

Ao se falar de “Moda”, o que se pensa imediatamente são em roupas, provavelmente roupas caras, e pouco práticas de se usar no dia a dia. Além disso, não deixamos de idealizar os desfiles glamourosos, com mulheres altas e magras, e talvez que tudo isso seja um tanto fútil. Eu certamente fazia parte desse grupo. Após assistir Favela é Moda, no entanto, esse universo ganhou novas dimensões, e chegou até mesmo a me emocionar.

O documentário de Emílio Domingos acompanha um grupo de jovens de áreas periféricas – Morro do Alemão, Duque de Caxias, Engenho Novo, etc – dentro da empresa Jacaré Moda, idealizada por Júlio Cesar, morador do Jacarézinho. A partir desse empreendimento, ele busca mudar o mundo da moda, fazendo com que este enxergue outros corpos além do padrão já estabelecido, mas sem idealismos.

“Isso não é uma ONG, não é serviço social, é uma empresa de moda” lembra Julio as mães que aguardam suas filhas serem escolhidas – ou não – para participarem da Jacaré Moda. “Estamos procurando o que o mundo da moda quer hoje”. Pode parecer cruel, mas um dos grandes trunfos de Favela é Moda, é não romantizar as situações. Não há deslumbre com as possibilidades que o mundo da moda oferece, “pode até ter uma capa com mulheres negras” diz uma das entrevistadas, “mas eu sei que a decisão final disso é de um homem branco e rico”.

Seria fácil apresentar uma narrativa na qual fetichiza, ou romantiza a situação dessas pessoas, todavia Emílio consegue, através de uma direção retraída, oferecer a visão mais objetiva possível desse mundo. Deixando que as situações se desenrolem de modo natural, tudo decorrente na tela aparece de modo muito genuìno. Essa visão “nua e crua” da situação também vêm através das diversas sequências de treinamento. Moda pode até ser só andar bonito na passarela ou tirar belas fotos, mas há técnica pra isso, que o longa se dedica bastante em mostrar.

Mesmo quando ocorre uma certa romantização, existe uma justificativa, como diz uma das entrevistadas, “a gente romantiza algumas coisas, se não a gente não aguenta.” A moda para os personagens é mais do que uma possível profissão, é um modo de se mostrar para o mundo, explorar a identidade e a cultura do lugar onde você vive. 

Favela é Moda é um filme muito poderoso. Soa clichê falar isso, porém não deixa de ser verdade. É difícil não se deixar levar pela força dos personagens, ou não se identificar. Eu, como morador da baixada fluminense, não pude deixar de me afetar pela entrevistada que teve problemas para arranjar oportunidades justamente por morar lá. Ao focar no aspecto humano dessa história, o documentário humaniza até mesmo a própria ideia de moda, criando reflexões e me fazendo as concepções que tinha sobre esse mundo.

Esse texto faz parte da nossa cobertura do Festival do Rio 2019

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