Crítica – How To Have Sex
Dos diversos méritos de How To Have Sex, um precisa ser destacado, pelo menos inicialmente: o de tornar uma festa adolescente, cheia dos exageros típicos da juventude, algo divertido até para quem nunca gostou muito dessas coisas, o meu caso. Dá saudade de ser jovem, compartilhar uma casa com outras cinco pessoas, e curar a ressaca com mais bebida.
Esse clima leve apresentado no primeiro momento no longa de estreia de Molly Manning Walker é importante, pois coloca o espectador na mesma condição do seu trio de protagonista. São três jovens britânicas que decidem fazer uma última viagem antes de entrar para a faculdade. Uma delas, Tara (Mia McKenna-Bruce), tem um objetivo um pouco mais íntimo: finalmente perder a virgindade. Ao chegarem em Mália, na Grécia, as jovens mandam um papinho na recepcionista do hotel para conseguirem um quarto com vista para a piscina e tudo é festa. As investidas dos garotos são recebidas com piadas e elas se esbaldam cantando (mal) no Karaokê, enquanto bebem drinques gigantescos. O retorno para o hotel é cambaleante, mas seguro, enquanto elas comem batatas fritas e fazem juras de amizade eterna. A câmera flutua entre rostos, paisagens e eventos, dando a impressão de uma noite onde tudo pode acontecer.
Mas, aqui e ali, rachaduras nesse aparente clima de descontração aparecem, sutis a princípio. O plano se demora alguns segundos a mais no olhar que Skye (Lara Peake) dirige à amiga enquanto trocam de roupa; seria inveja? Mesmo Tara, visivelmente interessada em outro jovem, Badger (Shaun Thomas), Skye tenta engatá-la com outro rapaz. Até mesmo Tara, por vezes, parece se desconectar dos eventos ao seu redor.
Pouco a pouco, o que parecia ser um filme interessado puramente nas alegrias da juventude logo ganha um espectro que começa a pesar nas cenas onde Tara interage com o sexo oposto. A protagonista passa a ficar alienada do ambiente ao seu redor. Se o quadro antes era recheado de pessoas dançando, brincando e afins, cenas dela sozinha passam a ser a norma, e ela vira mais espectadora do que participante dos eventos.
A representação da violência sexual no cinema sempre é um ponto de discussão, pois não é difícil encontrar exemplos que se apoiam no choque puro e simples, como Irreversível, tornando um evento horrível ainda mais desumanizante. Ou casos onde é deixada ambígua a recepção da vítima a esse evento. How To Have Sex deixa claro o acontecimento sem se tornar uma sessão de tortura; o foco é em Tara e na sua reação ao evento.
A perda da virgindade é o mote de muitos filmes, geralmente como ponto final, mas em How To Have Sex, essa vontade, e a sua satisfação, é um ponto de partida para conversas mais maduras e necessárias sobre dinâmicas de gênero, especialmente quando se é jovem, e há muita pressão para performar alguns comportamentos, mesmo que não seja de agrado. Manning Walker consegue fazer isso sem culpar a cultura de festa como um todo; não se trata de uma condenação da juventude, pois Tara encontra solidariedade mesmo entre estranhos. A violência não se dá numa balada com um desconhecido, mas num momento cotidiano, com a anuência até de uma suposta amiga.
How To Have Sex é um olhar cuidadoso sobre a juventude, ciente das suas alegrias e também dos seus perigos, mas sem pesar a mão, estabelecendo de forma confiante as relações em cena e contando que o espectador é inteligente o bastante para entender os acontecimentos.
Essa crítica faz parte da cobertura do Senta Aí do Festival do Rio 2023