Crítica – Licorice Pizza
Ah, a juventude. Tão desejada por uns, e tão subvalorizada por outros. Enquanto as crianças querem urgentemente que a maioridade chegue, pessoas de meia idade se deparam com a nostalgia agridoce que corrói seus pensamentos. “Nossa, como eu era feliz quando ainda tinha cabelo” diria Larry David. “Não vejo a hora de sair desse patamar infantil e ser levada mais a sério” diria Olivia Rodrigo. Quem está mais certo? Quem tem razão dentro desse debate existencial?
É basicamente isso que Paul Thomas Anderson se dedica a responder em Licorice Pizza. Ou pelo menos foi um dos temas principais que absorvi dele. A junção do frescor da imaturidade com a rancorosa e apática experiência de vida. O que acontece se a gente misturar os dois? BOOM! Uma combinação perigosa, cheia de aventuras e trapaças, a especialidade do diretor. Uma amálgama de romancismo e tortuosidade. Uma jornada quase igual a da novela das 7 que faz minha vó gritar com toda a força de seu pulmão: “FIQUEM JUNTOS LOGO, MEU DEUS”. São tantas idas e vindas, tantos estágios diferentes, que em momentos o filme parecia drenar sua força vital diretamente do clássico When Harry Met Sally. Mas não podia ser diferente, os personagens que PTA criou pra representar esse choque geracional são complexos demais e verdadeiros demais.
Alana e Gary, protagonistas do filme, tem uma dinâmica poucas vezes vista no cinema. Não são o casal típico de Hollywood e muito menos se assemelham aos pares românticos de comédias ‘pastelão’ da Netflix. O filme não se propõe a ser uma história de amor, mas sim uma história do tempo. Afinal, é o tempo que dita como encaramos nossa vida e o que tiramos de proveitoso dos encontros que ela proporciona.
Alana tá quase chegando nos 30. Gary é um menino com 15 anos recém completados. De começo, os dois tem uma relação mais aventurosa do que amorosa, apesar do garoto jurar de pé junto que tá apaixonado e que seu amor por Alana foi de primeira vista. Porém, o que une Alana a Gary neste início é simplesmente o fato de sair do convencional, deixar pra trás a apatia do período adulto e tentar se reconectar com o passado rebelde. Ela vê no ambicioso e juvenil Gary, uma chance de entrar num mundo completamente novo e cheio de possibilidades. E ela pula de cabeça nesse universo. E é aí que começa a intensa jornada de Licorice Pizza. E é assim que começa a resposta de PTA a nossa pergunta do início.
E ele nos responde de todas maneiras possíveis. Seja pelo roteiro doce e inescrupuloso, seja pela paleta de cores que muda frequentemente ou até pelo tom de fotografia, que no final sofre uma metamorfose geracional. Quando os nossos protagonistas finalmente se encontram na posição correta e, no momento certo, eles finalmente amadurecem juntos. A paleta de cores se transforma do azul inocente pro vermelho sazonado. A fotografia passa a usar uma lente mais escura e o roteiro finalmente nos entrega o final de novela que nos é merecido.
E esse final do longa foi um pouco debatido na internet né? Vi alguns falando que foi muito típico, muito tradicional. Na minha opinião, o filme cai naquele tropo de “subversão de expectativa”. O que também se encaixa na temática dele de ser uma peça transformativa e não reflexiva. Galera tá muito acostumada com o estilo Nolan ou eu sou um dos últimos românticos mesmo ein?
Outro burburinho muito visto pela internet é o elogio a performance da estreante Alana Haim como estrela do filme. E realmente, ela é cativante ao extremo. Não tem um momento que nosso olhar não se redirecione pra ela e ela somente. Mesmo em momentos de menos brilho, a jovem bateirista do conjunto HAIM é o destaque indescutível dessa produção. Alana tem o carisma semelhante ao de um raio de sol após uma chuva torrencial. Um belo contraste com a canalhice e arrogância de Cooper Hoffman, filho do falecido Phillip Seymour-Hoffman.
Mas enfim, a resposta da nossa charada lá do começo já está simplesmente óbvia nesse ponto. E foi muito bem trabalhada ao longo de duas horas de filme. Não se preocupa com o cabelo caindo não, tio. Vai viver, vai se emocionar, vai achar alguém pra partilhar teus momentos. Ás vezes a gente precisa de novas perspectivas pra poder nos permitir arriscar de novo, sentir medo de novo, se apaixonar de novo.
Já pra criança maldita com complexo de adulto só tenho uma coisa a dizer: bota o pé no freio um pouco. Não seja um chato que nem o Gary, ok.
Pra resumir, Paul Thomas Anderson nos traz um quebra-cabeça delicioso. Um registro de uma época em que a ingenuidade era um ativo valioso e uma representação de L.A como um reduto de malucos sonhadores. Alguns acabam perdendo sua maluquice conforme os anos passam. E esse é o problema. Por isso, Licorice Pizza quer resgatar esse elo perdido.