Crítica – Luana Muniz: Filha da Lua

Um mea culpa: até assistir Luana Muniz: Filha da Lua, eu não tinha conhecimento dessa figura tão importante da Lapa. Conhecia uma das histórias mais famosas dela, acerca de sua participação no programa Profissão: Repórter e do bordão “travesti não é bagunça”, que viralizou à época, mas não conectava esses eventos a pessoa Luana Muniz, que tem uma longa história no cenário LGBTQIA+ e no Rio de Janeiro.

E talvez poucos documentários seriam tão eficazes em sanar minha ignorância sobre essa personagem do que este, dirigido por Rian Córdova e Leonardo Menezes. A dupla não busca uma narrativa cronológica de Luana – suas “origens”, por assim dizer, não são discutidas -, porém sim uma que analisa o impacto dela no mundo ao seu redor. Tão importante quanto a presença da personagem titular, são as outras entrevistas que compreendem um número bem grande de pessoas cuja vida tem relação com a de Luana de várias maneiras. É um documentário relativamente curto, 78 minutos, mas cada minuto apresenta um rosto novo, uma informação nova, mais uma faceta da vida de Luana é revelada.

Nada mais justo que para uma pessoa tão expansiva quanto a Rainha da Lapa, o filme que busca capturar um pouco da sua vida seja igualmente expansivo. Filha da Lua não pega a rota fácil de explorar ostensivamente o episódio que a tornou famosa para além dos nichos, mas busca registrar a imensidão da existência de Luana, que fala sobre si mesma, sobre suas ações e fragilidades sem grandes pudores. “Travesti precisa se impor”, diz ela em certo momento, e isso é muito bem capturado ao longo do documentário.

Há um motivo para eu ter destacado minha ignorância sobre Luana no início do texto, porque há uma informação no documentário que, para mim, aparentou ser uma tremenda “reviravolta”: Luana não está mais entre nós. Faleceu em meio de 2017, devido uma parada cardiorrespiratória. Essa informação é revelada quase sem querer por um dos entrevistados, o Padre Fábio de Mello, ao dizer que não conseguia apagar as conversas dela do seu celular. É a partir desse momento que o longa ganha ares de retrato póstumo, mostrando seu funeral, e as pessoas reagindo à memória dela.

É testamento da força da presença de Luana, e também do trabalho de montagem do documentário, que até aquele exato momento não havia motivos para desconfiar de que Luana estava viva, lidando com a pandemia e ajudando seus semelhantes como sempre fez. Isso é transmitido também nas entrevistas, que, mesmo após a morte dela integrar a narrativa, ainda a tratam no verbo presente. Uma chega a falar “Luana era…não, é ainda”. 

Luana Muniz: Filha da Lua, formalmente, é simples, com o formato de “cabeças falantes” de tantos outros documentários predominando. Mas é tão cheio de vida, tão cheio de histórias, relatos e personagens, que mais do que compensa certa mesmice visual. É cinema como defesa contra o tempo, contra a morte, em sua primazia. 

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