Crítica – Madeira e Água

É o primeiro dia da aposentadoria de Anke (Anke Bak), que até então trabalhava cuidando de uma igreja perto de onde mora, no interior da Alemanha, mas mesmo assim ela vai até o local, como a boa católica devota que é. Saindo de lá, ela monta em sua bicicleta e começa a pedalar em direção ao seu lar, a câmera começa a subir, até que Anke some, e só vemos a cidade ao seu redor, as construções tipicamente alemãs cercadas pela natureza, a personagem completamente perdida nesse cenário.

Essa integração com o ambiente se repete ao final de Madeira e Água, mas em outro lugar do mundo, em um cenário completamente oposto, só queque apresentando a mesma sensação, e essa jornada de um ponto ao outro, de conquista de certa paz mesmo em ambientes tão díspares, é o que torna o longa de Jonas Bak algo tão interessante.

Anke é uma senhora alemã que mora na região da Floresta Negra, sua casa é isolada, cercada pela natureza. Para comemorar a aposentadoria, ela chama seus filhos, já adultos, para passar uns tempos com ela. A maioria marca presença, menos um, Max, que está em Hong Kong participando dos protestos locais. Anke, que não o vê a três anos, decide, então, ir ao encontro de seu filho, em uma cidade totalmente diferente do seu habitat natural.

Madeira e Água possui um tom muito agridoce desde o início, há muita serenidade em seus planos estáticos, sempre em conexão com a natureza e com os elementos dentro deles sempre se movendo com certa calma, ou às vezes nem mesmo se mexendo. Mas também há muita solidão, com Anke sempre rodeada de muitos vazios, sem contar certo a postura distanciada da câmera em relação a ela, não é um filme de close ups e afins, mas sim de composições que evidenciam o corpo, e a sua pequenez diante dos espaços.

Madeira e Água

Quando o cenário passa a ser Hong Kong, no entanto, uma pequena mudança ocorre, especialmente na maneira que somos introduzidos naquele espaço. Se antes era de cima e de dia, agora é de baixo e a noite, com os arranhas céus e os outdoors luminosos sendo uma presença opressora, os planos continuam estáticos, mas a movimentação da cidade retira a calma de antes, e Anke agora se destaca nos ambientes, seu próprio corpo e postura evidenciando seu status de estrangeira.

Conforme a narrativa se desenvolve, a solidão de Anke continua, mas Madeira e Água é um filme sobre fazer as pazes com essa sensação, e tentar encontrar uma espécie de casa mesmo quando se está num lugar tão diferente do costume. Mesmo que a produção lide com protestos, geralmente um evento cercado de nervosismo, são tratados com a mesma placidez de todo o resto da narrativa. A calma com que Jonas Bak conduz essa jornada tão singela acaba por conquistar.

Esse texto faz parte da nossa cobertura da Mostra de São Paulo 2021

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