Crítica – Meu Nome é Gal

A primeira cena de Meu Nome é Gal mostra a cantora, ainda criança, testando o som em uma panela. Ela canta mais em cima e mais embaixo, vendo as possibilidades do som pela sua voz. A cena final soa como uma grande reverberação de tudo isso. Agora, Gal Costa já é uma artista gabaritada e se vê como alguém passível de mudar outras pessoas no seu famoso show “Fa-tal”, que se transformou em um de seus discos mais reconhecidos Gal a Todo Vapor. Ela testa as possibilidades da própria voz através de instrumentos elétricos e um público grande.

Esses ecos são a grande característica que o filme vai buscar ao retratar uma das figuras mais importantes e únicas da música popular brasileira. É muito menos uma cinebiografia inteira sobre uma personalidade e mais um retrato de um tempo. Essa ideia fica tão clara por parte das diretoras Lô Politi e Dandara Ferreira que elas estabelecem um recorte temporal bem curto ao longa. Começa pouco antes da gravação do seu primeiro disco, junto com Caetano Veloso, Domingo, de 1967, chegando no Rio de Janeiro. E termina, justamente, na apresentação citada anteriormente, em 1971. Um momento de efervescência política gigantesca no meio da ditadura militar e, acima disso, de expressões artísticas cada vez maiores no Brasil. Dentre elas, a fundação do tropicalismo.

Cena do filme Meu Nome é Gal

Tão cronometrado nesse conceito, é como se o filme não conseguisse se desgarrar de uma mesma concepção. Não a toa, deixa a própria protagonista de fora de relevância em diversas situações, como as diversas em que se discute elementos da própria tropicália. Do mesmo jeito, o grande destaque para a construção das composições de Caetano (Rodrigo Lelis) e Gilberto Gil (Dan Ferreira), figuras de tão destaque quanto Gal (Sophie Charlotte) dentro da duração de pouco mais de 1h30. São tantas ideias concebidas de forma fechada, que o próprio filme não deixa os grandes momentos, intrinsicamente conectados a artista, aparecerem. Um exemplo crônico disso é o fato de diversos personagens falarem de sua voz, mas essa nunca verdadeiramente aparecer.

É um grande quase. Talvez essa seja a melhor definição para Meu Nome é Gal. Mais preocupado em soar como um zeigest desse passado – o uso frequente de imagens de arquivo em contraste com as gravações ou até mesmo querendo parecer com câmeras antigas -, o filme esquece em boa parte dele de também ser uma obra sobre essa artista em ascensão. Pouco explorada, ela vira e mexe se transforma em alguém secundário nas diversas discussões.

Aliás, a encenação quase nunca sabe bem o que fazer nesses instantes, tentando colocar uma montagem que busque os pequenos detalhes do corpo de Gal Costa, por exemplo. Contudo, é quase um imenso contraste com a grandeza da mesma figura. Enquanto ela está perante outros, é alguém menor, tanto que nunca tem verdadeiras possibilidades de escolher por si própria. Se a obra toma certas liberdades criativas usando uma ficionalizando em eventos reais (a brincadeira das vozes em estúdio serem, em grande maioria, as reais e não de Sophie, funciona bem), poderia se utilizar disso como ferramenta narrativa para esse mesmo período, ainda muito incipiente da carreira.

Cena do filme Meu Nome é Gal

Apressado demais na resolução de tudo e na forma como todos os pequenos elementos são construídos em si mesmo, Meu Nome é Gal parece um grande filme feito pela metade. Para um público que não sabe quase nada da artista, seguirá sabendo muito pouco. Aos que compreendem mais a história da mesma, talvez ficarão desapontados pela maneira como esse momento de efervescência cultural é tratado. Talvez faltasse um pouco mais de carinho com um dos nomes mais importantes da música brasileira. Definitivamente, é preciso estar atento e forte para ver.

Essa crítica faz parte da cobertura do Senta Aí do Festival do Rio 2023

Comentários

Cláudio Gabriel

É apaixonado por cinema, séries, música, quadrinhos e qualquer elemento da cultura pop que o faça feliz. Seu maior sonho é ver o Senta Aí sendo reconhecido... e acha que isso está mais próximo do que se espera.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *