Crítica – O Bom Doutor

Apesar do título O Bom Doutor, a primeira impressão do espectador ao começar o filme é o oposto disso. Na cena inicial, vemos Serge (Michel Blanc), um médico parisiense, atendendo com certa impaciência um bebê que chora, alto. “Não dá para abaixar o volume dele?” diz o médico, que recebe como resposta o olhar incrédulo dos pais da criança, até que ele decide colocar o dedão na boca do infante para ter um pouco de silêncio, para, novamente, o assombro dos pais.

Ao encerrar a consulta, Serge vai para o seu carro, e começamos a ter mais detalhes daquele mundo e do próprio personagem. O porta luvas esconde uma garrafa de uísque, que ele prontamente mistura ao café, o que não é a melhor conduta para um médico de plantão. Logo, por meio de uma ligação informando que há outro atendimento a ser feito, sabemos que é a noite de Natal, uma data difícil para Serge, devido a uma tragédia familiar. Tudo aponta que será uma noite de trabalho típica para o profissional, até que dois eventos descarrilam a noite de trabalho: primeiro, seu caminho se cruza com o de Malek (Hakim Jemili), um jovem entregador de Uber Eats, mas que prefere usar o termo “empreendedor” para se descrever, e segundo, um problema na coluna faz com que Serge fique impossibilitado de se locomover. Ainda precisando realizar vários atendimentos naquela noite e com o emprego por um fio, Serge recruta Malek para atender em seu lugar, guiando o jovem nas consultas.

Um par formado por uma pessoa mais velha e calejada pela vida e outra mais jovem, animada. É uma fórmula já conhecida dos famosos buddy cop movies, como Máquina Mortífera, por exemplo, e funciona muito bem em O Bom Doutor. A dinâmica entre o par principal é sempre divertida, recheada de alfinetadas, é claro, mas que pouco a pouco passa a envolver um respeito mútuo, quando passam a perceber que ambos podem aprender um com o outro.

O longa dirigido por  Tristan Séguéla até tenta abordar certas questões sérias ao longo da narrativa, como a uberização do trabalho e o preconceito sofrido pelos entregadores – em uma cena, Malek é humilhado por um cliente, que trata a situação como uma piada. Isso traz até um certo drama familiar, especialmente envolvendo Serge e Rose (Sólene Rigot), mas O Bom Doutor é mesmo uma comédia, e das mais leves, visto nem tenta criar muita tensão nas consultas ou com a possibilidade do arranjo dos dois ser descoberto.

O filme diz ser baseado em um caso real, então ele simplesmente se apoia na situação inusitada, nunca fugindo muito do tom de “anedota curiosa” e engraçadinha. Cada cena de consulta apresenta sua particularidade, então nunca é repetitivo, uma cena é mais voltada para o humor escatológico, outra uma situação um pouco mais séria, porém sem grandes problemas. Não dá para negar que O Bom Doutor é um filme, no mínimo, agradável  de se assistir, e talvez essa seja mesmo a única ambição da produção.

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