Crítica – Showbiz Kids
Em todo o seu prestígio e fama, o mundo do cinema conseguiu construir uma aura de mágica e glamour que funciona também como uma cortina de fumaça para suas engrenagens não tão encantadoras. É um acordo silencioso que por trás da lendária indústria existem inúmeros e sistemáticos problemas, que vão do puro racismo à falta de oportunidade e assédio moral e sexual. Dessa forma, é fácil esquecer que há crianças crescendo nesses ambientes e trabalhando como se não fossem mais crianças. As mesmas crianças que parecem espertas demais para a idade que tem (e geralmente o são), exibindo talento e maturidade além de seus anos e conquistando audiências, produtores e cheques gordos antes mesmo de completarem quinze anos. É sobre elas que o novo documentário da HBO, Showbiz Kids, quer falar.
Dirigido e escrito por Alex Winter, a produção busca expor os altos e baixos da carreira de uma estrela mirim, mostrando como uma carreira na indústria do entretenimento em uma idade tão precoce pode afetar profundamente o psicológico e o futuro dessas crianças. Winter faz isso através de entrevistas com atores conhecidos por seus trabalhos na infância, como Evan Rachel Wood, Wil Wheaton, Cameron Boyce e Milla Jovovich. Além disso, ele também conversa um pouco sobre Baby Peggy, a primeira grande estrela mirim americana, e acompanha a jornada de duas crianças em atuação no ramo.
Famosa por ter estrelado os clássicos noventistas “Matilda” e “Uma Babá Quase Perfeita”, Mara Wilson descreve sua experiência em Hollywood como o momento em que todos estão cantando “parabéns pra você” e você não sabe o que fazer. É agradável, mas também desconfortável, assim como o tom do documentário. Winter tece uma linha narrativa que celebra a carreira e o talento destes artistas ao mesmo tempo em que é quase uma parábola de advertência para aqueles que desejam entrar no ramo. Sem abrir mão da leveza de uma conversa sincera, o diretor também se aprofunda em tópicos mais sensíveis, como o aliciamento de menores discutido nos depoimentos de Rachel Wood e Jovovich.
Ao mesmo tempo que a quantidade de tópicos a ser abordados poderia facilitar o trabalho de Winter, ele ainda precisa quebrar toda a mitologia envolvida nessas figuras. Foram crianças exploradas pelos pais? Foram vítimas de abuso por figuras de poder e nunca puderam trazer isso a público (nem terão chance de fazê-lo)? São mimados e arrogantes? O que diretor faz é deixar que elas mesmas contem suas experiências e histórias, ele lhes dá a voz de uma maneira que raramente puderam ter ao longo de suas carreiras e extrai o que há de comum em todas essas perspectivas para, então, analisar esse cenário e destacar seus pontos positivos e negativos.
No entanto, nem tudo agrega. As passagens que acompanham Marc, que está em busca de seu primeiro trabalho, e Demi Singleton, que já conseguiu alguns papéis de destaque no teatro, quase não trazem nada de novo que não tenha sido discutido pelos atores. Com exceção, talvez, do momento em que acompanhamos o menino em uma de suas aulas de atuação. Trechos anteriores mostram que os pais de Marc estão apenas fazendo o que ele quer, mas atuar é mesmo o que ele deseja fazer? Apesar do carisma desses dois, o tempo de tela dedicado a eles poderia ser melhor aproveitado.
Embora não fuja de assuntos pesados como a pedofilia, irresponsabilidade parental e a liberdade excessiva, o documentário perde um pouco de sua força ao se limitar às experiências dos que ainda “saíram por cima”. Ainda assim, Showbiz Kids é um retrato honesto da infância diante das câmeras e dos holofotes. Ele não nega ao espectador o deslumbramento e a energia presente nessas histórias, o que pode explicar porque elas se repitam tanto. Afinal, a cada geração nascem novos sonhadores. Se o mundo é seguro para eles, aí é outra história.