Resenha – Nós Somos a Cidade (N. K. Jemisin)

De que maneira nós entendemos a relação com a cidade? Ou, mais ainda, as cidades fazem realmente parte da nossa vida, como algo verdadeiramente vivo? Esses são alguns questionamentos dentro da cabeça da autora estadunidense N. K. Jemisin ao realizar Nós Somos a Cidade. Mais do que apenas isso, sua busca parecia ser por compreender, de forma totalmente profunda, a forma como nos entendemos com esse elemento do urbano, com cada local para onde frequentamos. Sei que não parece nada fácil, mas é justamente essa a formatação trazida pela mente da escritora, ao trabalhar os pequenos microcosmos que nos tornam parte de algo.

É uma espécie de tribo e as cidades aqui, de um certo jeito, também estão dentro disso. Isso porque, na história, acompanhamos as almas e corporalizações, por assim dizer, de todas as cidades. Apesar de viverem também seu lado obscuro, que espera o momento certo para aparecer. Assim, Nova York desperta como um garoto de rua e fica horrorizado com as dificuldades da vida humana e todos tentando destrui-lo. Assim, cinco outras personas acabam sendo chamados para ajudar nessa situação, em que um invasor aparece. Personificados, Bronx, Manhattan, Queens, Brooklyn e Staten Island aparecem nessa ajuda, atrás de destruir o mal que se espreita.

É até bastante curioso como, ao olharmos o básico dessa narrativa, tenhamos até uma certa estranheza por parte de Nós Somos a Cidade. Por um lado, parecemos estar lidando quase com uma fábula infantil, especialmente nessa luta do bem contra o mal, mas que também perpassa por um aspecto filosófico do pertencimento. É um pouco desse embate que Jemisin vai tratar ao longo do livro, especialmente ao trazer questões sobre a complexificação de uma sociedade. Desse jeito, o racismo, o machismo e a homofobia, acabam fazendo parte das discussões e questionamentos que cada uma das cidades vai passar ao longo da vida. Assim, é quase como se isso fosse, de forma involuntária, interligado com a própria ideia de cidade.

Mas a autora é dura nas discussões que apresenta desse mundo que vai se construindo dentro do mundo. Nunca existe um caráter mais aberto ou até mesmo divertido, já que a dark fantasy absorve cada ponto do desenvolvimento da trama. Por exemplo, as discussões dos personagens sobre obra de arte em um determinado momento no meio da obra, se absorvem de um elemento sobre construção e reconstrução humana. Até que ponto essa sociedade atual, em que vivemos, pode ser uma exata, que está trazendo apenas o bem? Do mesmo jeito, os embates sobre a realidade do mundo também estão conectados com as dificuldades de existência que esses povos excluídos enfrentam ao longo do tempo.

Vencedora três vezes seguidas do Prêmio Hugo de ficção-científicaN. K. Jemisin vai atrás de uma tese para dentro de Nós Somos a Cidade. Longe de ser um livro que está buscando os trabalhos da própria condição dramática interna, a obra parece ter uma verdadeira noção sobre a busca por reconstruir o mundo existente. De certo modo, é quase como se estivéssemos trabalhando com um texto que perpassa o tempo – e é um pouco esse o interesse da escritora. Mas se essa tese traz ecos exatos na realidade? Difícil dizer.

Comentários

Cláudio Gabriel

É apaixonado por cinema, séries, música, quadrinhos e qualquer elemento da cultura pop que o faça feliz. Seu maior sonho é ver o Senta Aí sendo reconhecido... e acha que isso está mais próximo do que se espera.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *