Crítica – Uncoupled (1ª Temporada)
Há um certo estigma ao pensar em algumas obras. Por exemplo, o reality show RuPaul’s Drag Race é costumeiramente reconhecido como uma produção para o público LGBTQIA+. Ou, em outro exemplo, os filme de ação dos anos 1980 parecem ser destinados aos homens e, em sua maioria, mais velhos. Só que todas elas não são únicas para uma determinada audiência. A primeira vista, pensando puramente nesses preconceitos apresentados, é possível ver Uncoupled como uma série destinada para o público gay, ao retratar um homem gay buscando novos propósitos na vida e nos relacionamentos depois do fim de um namoro de 17 anos. Contudo, mais uma vez, pouco importa a camada superficial apresentada, já que o que interessa são os desenvolvimentos nela feitos.
Desse jeito, o seriado de Jeffrey Richman e Darren Star ocorre em dois preceitos: desconstrução e reconstrução. O primeiro, ao tentar observar Michael (Neil Patrick Harris), o personagem principal, como alguém fora do seu tempo dentro do próprio mundo no qual faz parte. Ele já não sabe direito como buscar algum parceiro sexual, e nem mesmo entende os flertes do mundo moderno. Nesse sentido, os episódios tem até um caráter bem comum, por abordarem a temática de um homem do “passado” se colocando no “presente”. Ele se vê como realmente uma persona ultrapassada e seus contatos são menos divertidos e mais, normalmente, tensos.
É o aspecto da reconstrução aquele que sobressai nos capítulos, já que ele constrói o núcleo composto pelo protagonista, e seus amigos Suzanne (Tisha Campbell), Stanley (Brooks Ashmanskas) e Billy (Emerson Brooks). Todos passam por processos de readaptação, observação de novas memórias, e, o mais primordial de tudo, entendimento sobre si mesmos. A série aborda esse lado em uma perspectiva dramática, contrastando com a comédia de situações onipresente. São figuras vívidas e também inteiramente perdidas, sem saberem o que fazer com situações específicas. No caso dos quatro, tudo envolve o amor, seja ele familiar ou romântico.
A produção demora até um pouco a engrenar a narrativa primordial e pode cansar por um aspecto bem simples: seu caráter cíclico. As tramas avançam pelos pequenos detalhes e menos em grandes arcos. Assim, exemplificando, vemos algumas vezes Michael saindo com algum homem, se deslumbrando com a possibilidade de um relacionamento e, no fim das contas, saindo totalmente desapontado. Essa pirueta de acontecimentos pode soar cansativa, mas faz sentido com a proposta de um homem gay em busca de algo. Ele não entende bem ainda a distância da sua relação duradoura anterior e quer colocar ela sempre em comparativo com os novos conhecidos.
Por esse olhar da cidade e da intimidade da relação do protagonista com os amigos, há uma similaridade com a construção de Sex in the City e Uncoupled. Se na primeira tudo parecia estar bem atrelado a um mundo em que era possível ser uma pessoa mais velha e plenamente solteira, o universo do século XXI traz apenas dificuldades para pessoas cada vez mais velhas. Estar acima dos 40 anos se torna cada vez mais um problema. O seriado de Jeffrey Richman e Darren Star até chega a trazer um pouco disso, mas sem tanta profundida. Seu foco é tentar olhar para Michael como uma pessoa que não vai desistir de sua busca. E a maior delas, de poder ser feliz novamente.