Crítica – Vengeance is Mine, All Others Pay Cash
Há muito para se admirar em Vengeance is Mine, All Others Pay Cash, longa da Indonésia que venceu o Leopardo de Ouro no Festival de Locarno deste ano. Há uma postura muito despojada no seu desenvolvimento, que vai do ridículo ao romântico na mesma cena, sem medo de ser feliz. Isso sem contar algumas das cenas de ação, que combinam uma coreografia clara com humor corporal de modo muito eficaz. O diretor Edwin quer fazer muita coisa com a produção, é visível, e funciona, mas só às vezes.
O longa acompanha Ajo Kawir (Marthino Lio), um destemido lutador de rua que encara a morte de frente, sorrindo. Mas isso decorre de um grave problema que possui, “somente um homem que não consegue ter uma ereção consegue encarar a morte sem temor”, diz o próprio logo no início do filme. Apesar de toda sua bravura e habilidade marcial, esse pequeno detalhe assombra o personagem, que busca várias maneiras de solucionar essa questão. Após ser contratado para eliminar uma pessoa, Ajo encontra Iteung (Ladya Cheryl), guarda costas do seu alvo, naturalmente, os dois brigam, mas dessa briga surge um inesperado romance, onde cada um terá que lidar com suas inseguranças e desejos.
Assim, no cerne de Vengeance is Mine está um romance, mas é algo bem, digamos, peculiar, especialmente pelo foco dado a impotência de Ajo, que acaba pautando quase todos os momentos do filme, os conferindo uma aura levemente ridícula. A famosa cena de declaração na chuva, por exemplo, está presente aqui, mas quando a recusa de Ajo se dá por meio da frase “meu pau não consegue subir”, é difícil levar muito a sério. Há um tom novelesco nesses momentos que colaboram ainda mais com esse caráter meio farsesco.
É curioso como o diretor conecta as lutas com uma aproximação romântica, como se a violência e o amor fosse algo que andassem de lado a lado nesse mundo. São das lutas fluidas que muito da química entre os pares do longa se percebem, com o contato entre os corpos pouco a pouco dando espaço para outro tipo de toque, mais íntimo.
São nesses momentos, cheio de violência, romance e comédia, sem se levar muito a sério que Vengeance is Mine tem seus melhores momentos, porém que passam a dar espaço para algo um pouco mais dramático, sério, e acaba perdendo um pouco do foco. Não ajuda muito que há introdução de personagens que parecem completamente desconectados da trama, como a andrógina Jelita (Ratu Felisha), aparecendo subitamente, e nunca encontrando seu lugar na narrativa.
Assim, Vengeance Is Mine, All Others Pay Cash, certamente tem suas qualidades, mas que não conseguem carregar a trama por suas quase duas horas de duração. É sempre interessante ver um cineasta disposto a fazer várias coisas de uma vez só, especialmente de modo tão singular como acontece aqui, só que não deixa de ser uma pena que o resultado tenha somente partes interessantes, e não o todo.
Esse texto faz parte da cobertura do Festival Internacional de Cinema de Toronto 2021