Resenha – Correntes (Olga Tokarczuk)

Já falamos algumas vezes sobre a autora Olga Tokarczuk por aqui. Esse mundo cheio de receios, intenso e quase temeroso de se viver, acaba acompanhando boa parte da sua produção ao longo do tempo. Independente de como a narrativa está sendo explorada, seja em Sobre os Ossos dos Mortos ou A Alma Peridda, a artista nunca deixa seus elementos de fora. E isso, obviamente, estaria acompanhando seu grande trabalho de reflexões. Isso se podemos chamar Correntes, seu livro de fragmentos assim. Na exploração sobre tudo e sobre o nada, talvez seja aqui o local em que Olga mais desenrole todas suas temáticas.

E tem uma explicação bem básica e clara para isso, já que a obra é, na realidade, um compilado de diversos textos. Diferente de outros autores, contudo, aqui Tokarczuk busca eclodir sobre nossa relação com os lugares, o espaço e o tempo. Por isso, são diversos contos e pensamentos sobre viagens, países e cidades – até mesmo pontos pequenos de cada uma. Mas não há uma intenção em querer criar qualquer algo sobre cada uma delas, e sim ir atrás de entender a forma como esses pequenos pontos do mundo estão perante a humanidade em si.

É esse o ponto, aliás, que faz Correntes ser um livro bem mais complexo do que parece, a prióri. A produção parece querer olhar para uma condição mais complexa da existência, como se fosse impossível estarmos pensando e vivendo diferentes vidas em um mesmo momento. Assim, por exemplo, Olga Tokarczuk vai desde uma carta entre reis e súditos até mesmo para falar sobre uma viagem de avião que não deu certo. Isso acaba sendo central para percebemos a forma como a imensidão de possibilidades e existências que o planeta Terra contempla são quase impossíveis para realmente nossa capacidade de viver. É como se não merecessemos pertencer nessa realidade.

Fica claro então que a artista está bem menos interessada em querer respostas felizes ou até mesmo um elemento de esperança nesse universo. É muito mais pelo seu ponto de crueza e as complexidades da vida que entendemos o local em que ela quer chegar. Um exemplo claro é quando, em alguns poucos contos, Tokarczuk vai atrás de explorar sobre identidades familiares relacionadas a alguns locais (são os mais longos do trabalho). Esses instantes poderiam ser realmente desenvolvidos atrás de uma dramaticidade sobre o universo. Contudo, acabam observando bem mais a maneira que nos entendemos como sociedade sem ter nenhuma resposta. Por que acabamos nos relacionando tão fortemente a lugares? Impossível saber.

Sendo assim, Correntes consegue ser realmente um livro que parece não querer acabar deixando algo claro, uma mensagem. Apesar de ser uma produção de contos, pequenos fragmentos, Olga Tokarczuk elucida um todo, elucida a forma como o mundo acaba sendo tão complicado que é quase inacreditável como ainda é possível conviver nele. Uma sociedade tremida, incapaz de conviver como ela é atualmente. Assim, é quase inacreditável como conseguimos viver as diferentes realidades. Se nem na nossa própria terra é possível estar, como poderemos ir viajar a outros locais?

Comentários

Cláudio Gabriel

É apaixonado por cinema, séries, música, quadrinhos e qualquer elemento da cultura pop que o faça feliz. Seu maior sonho é ver o Senta Aí sendo reconhecido... e acha que isso está mais próximo do que se espera.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *