Demônios dominam papa em nova HQ de terror

“Há muito potencial para criar horror, em perverter algo conhecido, inocente e voltado para o nosso lado bom. Religião ou padres ou freiras. Eles deveriam estar aqui para nos ajudar, então tê-los fazendo exatamente o contrário é algo que nos deixa inquietos e às vezes horrorizados. E, às vezes, infelizmente, é verdade.” A fala é de El Torres, roteirista da HQ Exorcismo: Ritual Romano, em entrevista ao Senta Aí. Na sua história, o horror toma forma através de figuras reconhecidas como ‘perfeitas’. No caso, aqueles que pertencem à grande cúpula do Vaticano. E caso esses fossem controlados por demônios? O que poderia ser feito?

É a partir daí que a trama começa. Seguimos, então, John Brennan, um padre considerado traidor pela alta cúpula da Igreja Católica. Após tentativas seguidas (e fracassadas) de exorcizar o papa, não resta escolha a não ser seguir com esse para batalhar com o demônio. Convocado, Brennan não sabe muito bem aonde pisar, especialmente por não ser visto com bons olhos dentro da Igreja. Seu crime foi sempre ser radical demais perante os dogmas da própria.

Dessa forma, a HQ tenta trazer uma versão um tanto quanto alternativa sobre a renúncia de Bento XVI. Esse, que enfrentava um problema político forte dentro do Vaticano, não sofreu nada mostrado durante as 128 páginas. Ao contrário do papa da ficção, totalmente destruído física e psicologicamente. Fora daquelas paredes, sua imagem era de alguém com problemas.

“A Igreja Católica está sempre se regenerando e se transformando durante os tempos. Isso faz parte do seu grande sucesso. Ele nunca permanece estático e, esperançosamente, se adaptará aos tempos modernos com as demandas que eles exigem”, conta Torres. “E essa mudança é feita pelos “rebeldes”. Sim, nosso padre John Brennan é um rebelde sem causa que viu muito. é isso que é importante. Às vezes, os rituais e protocolos escondem o verdadeiro significado por trás deles. E, às vezes, precisamos ir ao âmago. É o que Brennan faz.”

Apesar de tudo, histórias envolvendo figuras religiosas sendo possuídas não são novidade na arte. Aliás, não são novidade nem no mundo dos quadrinhos. Recentemente, por exemplo, houve o filme A Freira, um grande sucesso de bilheteria. Então, o que faria essa obra ser realmente diferente?

É difícil dizer de caro, mas não há uma busca pelo novo, e sim pela tensão narrativa. O interesse maior colocado do quadrinista, junto do desenhista Jaime Martínez é na atmosfera do suspense. O medo, ainda mais em uma resolução de pequenos quadros, é mais transformado em toda a situação criada. Quem lê, assim, se sente parte desse universo rapidamente, pela maneira na qual estamos atrelados aos personagens. A luta maior do ‘herói’ dessa história está em modificar o padrão de pensamento da Igreja.

“Não somos os primeiros a fazer isso, é claro. Esse tipo de personagem já foi usado muitas vezes em muitas histórias. Há poder na iconografia que eles têm. E podemos usá-los como metáforas”, continua o autor espanhol. “Isso é o que fazemos. Em nossa história, estamos usando essas figuras do papa, do padre e da freira como metáforas. O que eles devem ser, o que são, por que o chefe da Igreja Católica pode estar contaminado e como eles lutam para se livrar dessa mácula. O próprio diabo é apenas uma metáfora do nosso lado sombrio. Portanto, não estamos falando apenas sobre demônios vomitando gosma verde, mas sobre qual é o papel da Igreja Católica quando ela é manchada”.

El Torres vem da Espanha, um lugar onde não é tão reconhecido diretamente pelo terror. Caso pensemos no país diretamente, as danças e o futebol talvez venham na frente. As próprias artes plásticas ganham forma na frente, sendo local de origem de artistas como Francisco de Goya. Apesar disso, ele defende a forma forte como o país vê esse gênero. Segundo ele, é impossível não ficar encantado com “uma boa atmosfera que o rodeia”. E ele não é o único.

“Tivemos e temos ótimos criadores de terror aqui. Muitos artistas de quadrinhos espanhóis estavam nos quadrinhos de terror da Warren Publishing. Pepe Gonzalez projetou Vampirella e quase todos os grandes artistas dos anos 70 estavam em Creepy e Rufus. Nos filmes, tivemos Eugenio Martín com Horror Express, ou Jess Franco, ou Paul Naschy. E hoje em dia temos diretores como Jaume Balagueró, Paco Plaza ou Alex de la Iglesia. Há algo sobre horror e Espanha. Não me pergunte o porquê”, completa.

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Comentários

Cláudio Gabriel

É apaixonado por cinema, séries, música, quadrinhos e qualquer elemento da cultura pop que o faça feliz. Seu maior sonho é ver o Senta Aí sendo reconhecido... e acha que isso está mais próximo do que se espera.

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