A inocência presente na filmografia de Wes Anderson

Eu não sou nenhum xerife Hopper (Stranger Things), mas preciso dizer três regras – e apenas três – para você que está lendo esse pequeno texto:

Regra número 1 – se não assistiu aos filmes citados, vá correndo assistir!

Regra número 2 – vá assistir TODOS os filmes do Wes.

Regra número 3 – siga às regras 1 e 2.

Contém spoilers.

 


Muitos diretores têm marcas, assim como fotógrafos, pintores e todo e qualquer artista. Se pedir para sua mãe, ou outra pessoa, dizer de qual autor é “aquele quadro super colorido com formas geométricas”, ela vai dizer: Romero Britto. Não que suas obras sejam muito bem vistas na Academia, mas isso é assunto para outra hora.

Assim como o pintor tem sua marca, o diretor também tem. Stanley Kubrick é um grande exemplo disso e nem precisamos dizer o porquê. Tarantino, Woody Allen… todos deixam sua marca. E não podia ser diferente com Wes Anderson.

É possível dizer que todos nós sabemos do Universo particular do cineasta. Ele mesmo o mostra, de diferentes formas, em cada longa que faz. Apesar dos filmes serem totalmente começados do zero, isto é, sem continuação, há algumas características marcantes presentes em todos eles: a fotografia, a câmera no carrinho, os personagens diferentes do que estamos acostumados e o mesmo grupo de atores.

Outra coisa que não é incomum encontrar, e que será tema desta matéria, é a inocência que permeia por toda sua filmografia.

Num mundo como o nosso, a inocência está cada vez mais rara e confundida com outras coisas. Nas obras de Wes, por outro lado, sempre há um personagem regido por algum certo tipo de inocência e não apenas sexual (a qual mais aparece em  outros filmes, ou mesmo a falta dela). Para entender melhor, podemos usar três exemplos:

 

Viagem a Darjeeling (2007)

Após um ano do funeral do pai, dois irmãos entram numa viagem, convidados pelo irmão mais velho. De início, a viagem é de cunho espiritual e para unir o trio que há muito não se viam. Depois de quase meia hora de filme, eles descobrem que, na verdade, o objetivo era reencontrarem com sua mãe. A inocência está justamente aí, entre o receio de serem abandonados novamente e a esperança de terem um colo materno.

Assim que encontram com a mãe (Anjelica Huston), ela os recebe de braços abertos depois de muita conversa. Juram se reaproximar a partir da manhã seguinte, entretanto, quando acordam, descobrem que a mãe foi embora, os abandonando de novo.

 

Moonrise Kingdom (2012)

Um jovem escoteiro conhece uma doce atriz numa peça da Igreja da pequena ilha onde vivem. Os dois começam a se corresponderem por cartas, se apaixonando com o tempo. Com problemas em suas vidas – ela, com sua família, ele, com seu grupo de escoteiros – montam um plano para fugirem juntos.

O filme é uma obra maravilhosa. Como dito anteriormente, uma coisa muito comum em seus filmes, é a câmera no carrinho. Aqui, ela consegue nos mostrar como os acontecimentos passam com o decorrer do tempo. Nesse caso, a inocência. Enquanto a câmera corre e o filme se desenrola, percebemos a traição da mãe da personagem, como as crianças são “problemáticas” na visão dos adultos e, o principal, a perda da inocência, aos poucos, de Suzy e Sam, – interpretados por Kara Hayward e Jared Gilman, respectivamente.

A transição de pular na água para o furar de orelha representa o início dessa perca de inocência (se, é claro, desconsiderarmos a primeira cena com sangue). O primeiro ‘’eu te amo’’, o beijo. E, o mais belo: enquanto o filme mostrava esse lado dos adolescentes, também deixava claro que ainda eram duas crianças, principalmente em seu amor puro ao se casarem e estarem dispostos a fazerem tudo um pelo outro.

 

O Grande Hotel Budapeste (2014)

Uma idosa milionária hospedada no Grande Hotel, num infortúnio, falece e sua família – até então desaparecida – surge querendo saber da herança. Sendo a mais importante dentre elas, um quadro valioso: Menino com uma Maçã. A história então acompanha o gerente do hotel e seu “assistente”, que buscam salvar o quadro que, na verdade, fazia parte da herança do próprio gerente, Monsieur Gustave H..

O rapaz, no entanto, conhece uma garota que é basicamente a imagem da inocência, ao mesmo que absurdamente perspicaz. Eles se apaixonam, como deve ser, mas questão aqui não é apenas a inocência de Agatha – interpretada por Saoirse Ronan –, mas também as cores.

O cinema não é nada sem a fotografia e, com Wes Anderson, ela é ainda mais importante, transformando-se em sua marca. A paleta de cores de O Grande Hotel Budapeste é… Fofa. Mesmo que haja um assassinato, etc., a inocência se encontra presente durante todo o filme através de suas cores. O tom pastel do rosa, do azul claro, o roxo, branco e vermelho, transforma tudo numa bolha de romance inocente.

É, simplesmente, espetacular.

Curiosidade: a pintura “Menino com uma Maçã” é uma obra de arte real do pintor inglês Michael Taylor, concluída em 2012.


Com esses três exemplos, dá para ver como Wes Anderson é genial, mostrando, de três formas diferentes, a inocência. Sem dúvida, é um dos diretores e roteiristas atuais, mais criativo e divertido, ao mesmo que centrado e original.

Seu próximo filme – Isle of Dogs – que será lançado em 2018, será sua segunda experiência com animação, seguida por O Fantástico Senhor Raposo (que vale a pena dar uma olha!). Será que encontraremos mais a inocência mais uma vez?

Confira o trailer:

Comentários

Isabela Toscano

Fotógrafa e escritora que adora ver filmes, séries e dogs. Sério, eu amo dogs.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *