Primeiras Impressões: AHS 1984
Desde que estreou, American Horror Story causa burburinho na comunidade televisiva. Se a conversa continua positiva da estreia até o final da temporada (ou se ela se inicia assim), aí já é outra história. Mas o fato é que a produção antológica de Ryan Murphy tem um espaço fixo no coração do grande público, esteja ele disposto a aclamá-la ou reclamar de histórias repetitivas ou furos. Lançada em 2011, antes da televisão ganhar um espaço ainda mais prestigioso no mundo do entretenimento, a série já passou por casas assombradas, bruxas, alienígenas, satanistas e até mesmo circos de aberrações. Foram poucos os estilos de narrativas de terror que não foram exploradas pela produção em pelo menos um episódio.
Por isso, é fácil se perguntar como demorou tanto tempo para que os slashers oitentistas não dessem as caras na famosa antologia. Em uma era pós-Stranger Things, onde a referência e a nostalgia reinam, AHS se manteve intacta por tempo o suficiente até que fosse inevitável mergulhar no lago de referências à filmes como Sexta-Feira 13, Acampamento Sinistro, Halloween e derivados. Com parte de seu elenco costumeiro reduzido (ou seja, sem Sarah Paulson, Evan Peters, Kathy Bates e outros veteranos) e apostando em nomes mais jovens (até mesmo pelo tema da temporada), estreou na quarta-feira (18/09) AHS 1984.
A princípio, testemunhamos o brutal assassinato de um grupo de jovens em uma cabana de acampamento. 14 anos depois, as novas futuras vítimas: a tímida universitária Brooke (Emma Roberts), a ginasta Montana (Billie Lourde), o aspirante a ator Xavier (Cody Fern) e seus amigos Ray (Deron Horton) e Chet (Gus Kenworthy). Jovens, bonitos e cheios de energia em meio ao caos de Los Angeles, o grupo se une a Xavier para trabalhar como monitores no Acampamento Redwood, que será reaberto e comandado pela moralista Margaret Booth (Leslie Grossman). A única incerta é Brooke, que muda de ideia após ser atacada pelo serial killer Richard Ramirez (ou The Night Stalker). Buscando fugir do perigo, ela se une aos amigos para o trabalho de verão sem imaginar que o lugar tem seu próprio assassino, Mr. Jingles, que aguardou por 14 anos a chance de voltar para casa e terminar o que começou.
Por anos, American Horror Story trabalhou com uma estrutura fixa. Além da escalação de atores certos e o rodízio de papéis, ainda havia algumas características marcantes do texto e do formato, como a presença de figuras históricas reais que se tornam essenciais para a narrativa, um forte apego à agilidade visual e o humor quase satírico. A presença de estrelas veteranas como Jessica Lange, Kathy Bates e Angela Bassett também ajudavam a elevar as performances do elenco num geral, trazendo um certo prestígio e destacando ainda mais os pontos altos do roteiro. E se isso funcionou muito bem por quatro anos, Roanoke mostrou que a série sabe se reinventar sem perder a qualidade. Com 84, a sensação é quase a mesma, mas falta algo.
O piloto segue a cartilha dos filmes de terror que ele claramente homenageia e parodia. A protagonista virginal com um passado que a persegue, a verborrágica coadjuvante platinada que sempre quer tirar a mocinha da zona de conforto sexual e social, o único amigo negro da turma, o bonitão, o convencido, acampamentos com segredos horríveis e um psicopata que foge do manicômio. Se tudo isso funciona de maneira prática e envolvente pela estética e pelo claro seguimento das regras, poucos elementos realmente se destacam fora o humor involuntário e o proposital. Billie Lourd se diverte na pele da desinibida Montana, exibindo caras e bocas que lembram a divertidíssima Chanel #3 de Scream Queens. E se até mesmo em Glee Matthew Morrison nunca fez questão de fugir de ser canastrão, aqui ele abraça esse lado com força e isso funciona muito bem na pele do bem-dotado Trevor.
Talvez o maior questionamento que a estreia desse ano deixa seja até onde os roteiristas irão levar a homenagem e a influência e transformar em algo próprio. As marcantes cenas de perseguição tiveram aqui uma versão pouco inspirada e rápida, com Brooke correndo do assassino pelo mato no meio da chuva apenas para ser creditada como louca quando todas as evidências apontadas pela personagem somem. É divertido, mas saber exatamente o que vai acontecer (e como) tira bastante a graça. Resta então, a trívia de tentar achar as referências escondidas e a quais filmes elas remetem, e admirar também a iconografia dos anos 80 que é refeita com esmero pela equipe de produção, algo que vai dos penteados exagerados aos figurinos coloridos. Outro mérito é a música de Mac Quale, que traz os sintetizadores que combinam tão bem com essa estética de uma maneira que combine perfeitamente com o tom das cenas e ainda trazendo uma identidade atual.
É claro que, sendo apenas o primeiro episódio, muita coisa pode mudar radicalmente. Afinal, é só lembrar do sexto e do oitavo anos, onde as histórias sofreram grandes reviravoltas por volta do quinto ou sexto episódio. Tratando-se do mesmo time, é difícil imaginar que o plano seja mesmo esticar uma história que enche um longa de 90 minutos por quase doze episódios. Portanto, ainda que seja essa a ideia, por mais preguiçosa que seja, não faz mal a ninguém e é um ótimo passatempo. Ao público, resta esperar e se divertir pra caramba no processo.
Observação:
Fica também um salve para a abertura, que traz um novo remix da música clássica com uma deliciosa edição oitentista.
