A efemeridade da vida em O Velho Gavião Arqueiro

Desde a criação de Velho Logan, em 2008, a Marvel sofreu um estigma dentro das suas HQs. A ideia pós-apocalíptica e a mistura com um gore absurdo sempre ficou colocada de lado, devido ao fato dessa história se tornar quase um suprassumo da editora. Nos últimos anos, uma tentativa de retornar toda essa mitologia criada por Mark Millar e Steve McNiven deu um pouco certo. Determinados arquétipos e personagens estavam de volta e o apocalipse se transformou em uma relação mais dramática do que só ação. Em 2018, um novo personagem ganhou espaço nesse microcosmo. O Velho Gavião Arqueiro trouxe o personagem para um habitat fora de seu ambiente urbano mais comum. Aqui, a vida é efemera para o personagens, mas seus atos e passado são eternos.

Na história, quase todos os heróis morreram e os vilões conquistaram o país. Clint Barton, o Gavião Arqueiro, continua vivo, mas vive na iminência de ficar cego a qualquer instante. Com pouco tempo pela frente para utilizar totalmente sua visão, ele decide por em prática a vingança de seus amigos do passado. O problema é que, enquanto ele busca essa vingança, Mercenário e Caveira Vermelha estão atrás de sua cabeça. Para sobreviver, Clint não poderá estar sozinho.

O roteiro de Ethan Sacks possui um drama muito caracterizado na trama. Aos poucos ele apresenta cada personagem importante para a trajetória e maneira na qual eles estão lidando com as situações. As primeiras edições focam bem mais nessa contextualização dramática, interessada em gerar um impacto da transformação desse mundo. Barton, o protagonista, sofre pela distância perante sua filha e seus amigos. A arte de Marco Checchetto potencializa esses olhares sempre tristes e frios do personagem, como se estivesse distante de tudo, sem entender muito bem seu papel nesse mundo. Os diálogos, as vezes puxados até para um caminho mais filosófico (especialmente na aparição dos Thunderbolts), trazem uma reflexão sobre a efemeridade da vida em um universo destruído.

Sacks constitui os vilões de maneira parecida, ainda que sejam bem mais frios. O costume das intensas motivações, parece se perder aqui no meio das gigantescas fumaças de areias. O Mercenário tem seu maior destaque em sua caça quase constante, se deparando com alguns desafios até próprios para alcançar. Venom também aparece, sempre otimizando mais as sequências de ação – destacadas nos capítulos finais, especialmente nos dois últimos. A continuidade na aparição dos antagonistas causa sempre essa constante tensão para o Gavião. Ele, a todo tempo, busca subterfúgio para seus dramas e problemas pessoais, todavia o dever lhe chama sempre. A pausa e o descanso nunca acontecem.

O desenvolvimento do problema de cegueira de Clint também é outro fator interessante na obra. Ele aparece de maneira mais sútil logo no início, ao errar uma flecha. O personagem, reconhecido por acertar sempre, começa a errar constantemente. Uma consulta médica posteriormente mostra sua condição já ruim, tornando-se destrutiva aos poucos. Os erros nas páginas depois, explicitamente ditos e outros apenas mostrados pelos traços, já dão uma sensação de um problema no ar. Essa situação, é claro, deverá ser explorada de maneira mais trabalhada, visto que esse é apenas o primeiro volume. Entretanto, essa intrigante construção coloca mais um empecilho, nos já diversos do herói.

A arte de Checchetto ainda explora um lado sanguenolento desse mundo apocalíptico. Não tendo medo algum de mostra sangue, acertos em orgãos e nos olhos. Essa vulgarização da violência eleva uma periculosidade já necessária de ser constituída em todos. O medo fia quase constante no ar para poder entender de qual forma todos poderão sobreviver, colocando a disposição dos quadros sempre em sequência de ação. Inclusive, isso exacerba o ponto anterior dito, falando sobre os erros e acertos das flechas do arqueiro.

O primeiro volume de O Velho Gavião Arqueiro traz um intrigante desenvolvimento para esse mundo apocalíptico da Marvel e suas próprias problemáticas. Além disso, ao focalizar no drama pessoal de Clint Barton, o roteiro busca entender o que o levou até ali, além de gerar diversos mistérios sobre a morte dos outros heróis. Apesar de, às vezes, soar repetitiva, a narrativa constrói diversas pontas abertas para possíveis condições futuras, na expectativa dos leitores de entender mais sobre esses personagens. Ethan Sacks parece entender a missão sem volta do protagonista, o colocando como o centro do quadrinho, nos fazendo já sentir sua falta no futuro.

Comentários

Cláudio Gabriel

É apaixonado por cinema, séries, música, quadrinhos e qualquer elemento da cultura pop que o faça feliz. Seu maior sonho é ver o Senta Aí sendo reconhecido... e acha que isso está mais próximo do que se espera.

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