Crítica – A Lavanderia
O mundo financeiro e seus trâmites não são coisas muito cinematográficas, embora os problemas que eles eventualmente causam possam ser. A Grande Aposta lidou com essa dificuldade de modo bem direto, colocando celebridades reais para explicar os complexos detalhes econômicos inerente ao assunto, para que o público “de fora” possa acompanhar melhor. A Lavanderia, de Steven Soderbegh, remete muito a obra de Adam McKay, tanto em assunto quanto em forma, mas não consegue ter o mesmo impacto.
O filme se baseia no caso dos Panama Papers, uma série de documentos vazados em 2016, na qual detalham o funcionamento de diversas empresas de fachada, que expôs diversos acionistas, empresários e até mesmo chefes de governo. Para contar essa história, Soderbergh se apoia nas figuras de Mossack (Gary Oldman) e Fonseca (Antonio Banderas), donos da firma Mossack Fonseca, de onde os dados foram vazados, e de Ellen (Meryl Streep), uma aposentada que investiga por conta própria uma firma de seguros fraudulenta após um acidente de barco causar a morte de seu marido.
Apesar de apresentar a história de Ellen como o fio condutor da história, o longa aos poucos passa a adotar uma estrutura mais episódica, chegando até a funcionar em um conceito mais individual, mas nunca parecem fazer parte de um todo coeso, particularmente por essa estrutura ser mal concebida. A trama da protagonista se coloca como uma investigação, ela nunca se resolve de fato, é somente abandonada, em favor de sequências que mostram como os super-ricos usam sua riqueza para os mais diversos fins, como subornar a própria filha para que ela se cale sobre um affair.
Ao invés de apostar no formato de antologia de modo mais explícito, Soderbergh e o roteirista Scott Z. Burns estão decididos a tentar manter a trama com um aspecto unificado, o que torna tudo meio disperso e sem foco. O grande clímax do filme, o vazamento dos documentos, chega sem peso nenhum, pois tudo que leva a esse momento, inexplicavelmente, acontece fora da tela.
A ideia de colocar a perspectiva daqueles que controlam o mundo econômico e dos afetados por essas decisões lado a lado é interessante, até para criar uma relação de causa e consequência nos atos de um para a vida do outro. O problema é isso nunca ser muito explorado, particularmente pois esses dois pólos parecem estar em filmes totalmente diferentes. Soderbergh nunca consegue controlar muito bem o tom, e enquanto os personagens de Oldman e Banderas convivem em um mundo um tanto exagerado, artificial e afetado, com direito a sotaques extravagantes, Streep vive sua história num tom bem mais realista e comedido, com o humor mais pontual.
Uma certa artificialidade permeia todo o trabalho da obra, no qual fecha e se encerra em locais que se assumem como cenários – até combinando bastante nas construções artificiais do mundo financeiro que governam o mundo. Novamente, ideia interessante, todavia que sofre pois a narrativa tem como ponto de partida uma situação que precisa ser genuína para funcionar, e o filme nunca consegue conciliar esses contrastes
A Lavanderia se propõe a falar de um assunto complexo, e acaba se perdendo nas diferentes implicações desse evento. Deseja falar dos absurdos da vida dos mega ricos e das ilegalidades que estes cometem, e também de como a pessoa comum é afetada por isso, além de tentar explicar como isso tudo foi possível e como fazer para a não ocorrência de eventos similares em períodos próximos de tempo. Há muito talento envolvido nessa produção, que se percebe em pequenos vislumbres, mas nunca forma uma figura completa muito interessante.