Crítica – Apresentando os Ricardos

Apresentando os Ricardos começa como se fosse uma espécie de documentário. Através de personalidades que teriam vivido a semana intensa de gravações e problemas nos bastidores do programa de TV I Love Lucy, começamos a compreender as dinâmicas ali presentes. Logo nesses primeiros minutos, entendemos que o momento é de conturbação política, que Lucille Ball (Nicole Kidman) é acusada de ser comunista e que a imprensa revela um possível caso de traição do marido dela, Desi Arnaz (Javier Bardem). Dentro desse ambiente caótico, vamos vendo, em paralelo, as gravações de um dos capítulos do seriado e os ensaios.

Na carreira como diretor até agora, Aaron Sorkin se notabilizou em A Grande Jogada Os 7 de Chicago por um cinema pulsante, de emergência. Isso contrasta com o que é apresentando aqui no longa analisado, já que, apesar da pressa dos diversos acontecimentos, ele é um filme sobre o íntimo. O diretor pouco se interessa nas dinâmicas dos bastidores, que são sempre passadas rapidamente, e está mais curioso na relação desses personagens com o backstage. Não é a essência daquilo que importa e sim a forma como acontece. Esse ponto aparenta desde essa construção documental até mesmo nos diversos momentos das conversas com portas fechadas (a quase todo instante tem “pode nos dar licença”). É quase impossível saber o que existe ali, apesar de ser sabido por todos, ao mesmo tempo.

Apesar da direção brincar com isso, Apresentando os Ricardos estranhamente nunca assume esse seu lado intimista. É bem claro como se trata de uma produção que vai atrás de compreender a personalidade de Lucille Ball. Assim, abre espaço para suas manias e até mesmo para a genialidade. Contudo, essa personalidade complexa de ser definida – que é reforçada em diálogos especialmente no pensamento de cenas para a série televisiva original – nunca realmente está em cheque dentro da narrativa. Sorkin poderia muito bem assumir esse interior de uma indústria refém do público e menos do talento por si só. Porém, prefere fazer uma intensa veneração.

Nesse sentido, temos um longa que engrena única e exclusivamente pela relação do casal principal. O desenvolvimento de cada um deles é mais exposto ao longo da trama do que verdadeiramente esse íntimo da indústria de Hollywood. Isso fica claro, por exemplo, pelos diversos instantes em que outras pessoas rememoraram a matéria que fala da traição por parte de Arnaz, algo diretamente rebatido por Lucille. Em certo sentido, é como se ela nunca verdadeiramente aceitasse o cosmo em que vive (a tensão para o momento da revelação dela poder ser comunista reforça esse aspecto), preferindo se ater a quem é, ou seja, uma atriz.

É uma dinâmica da farsa por parte desses personagens, em um universo que precisa se enganar a todo instante, porém que nunca assume isso. Em certo espaço, Sorkin até consegue trabalhar bem a maneira como essas personalidades estão sempre dominadas por certas figuras e que nunca há uma voz diferente no pensamento das emissoras e estúdios. Entretanto, é algo pueril, como todas as formas que o filme quer abraçar. Esse íntimo de tudo que envolve Lucille Ball, que é o aspecto chave da narrativa, é sempre renegado pelos acontecimentos.

Aaron Sorkin traz em Apresentando os Ricardos um longa que não sabe bem quais caminhos assumir. Em certa ponta, ele quer abraçar um mundo dominado pelo mínimo, pelas portas fechadas e pelas conversas que acontecem ali. Todavia, a direção pouco aprofunda nesse sentido, que é primordial para entender uma história sobre a uma protagonista renegada. Ao se importar mais como a forma desses fatos e com uma perfomance de cena, a produção não chega a lugar nenhum. Apesar de ter seus momentos, nem é sobre Lucille e nem sobre essa semana tão demarcada na sequência primordial.

Comentários

Cláudio Gabriel

É apaixonado por cinema, séries, música, quadrinhos e qualquer elemento da cultura pop que o faça feliz. Seu maior sonho é ver o Senta Aí sendo reconhecido... e acha que isso está mais próximo do que se espera.

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