Crítica – Joias Brutas

O cinema dos irmãos Safdie tem um foco muito específico. É possível ver que tanto Heavens Knows What e Bom Comportamento retratam habitantes marginalizados de Nova York tentando se manter da melhor maneira que podem, seja através de bicos ou roubos, com resultados adversos para boa parte dos envolvidos. Jóias Brutas muda um pouco essa fórmula, já que seu protagonista, Howard Ratner (Adam Sandler) está em uma posição consideravelmente mais alta na “cadeia alimentar” do que os outros protagonistas dos cineastas, mas isso não quer dizer que a situação dele seja confortável.

Situação essa que é inteiramente de seu próprio feitio, fruto de vício em apostas e da busca obsessiva pela próxima “grande conquista” de sua vida, mesmo que a detrimento de todo o resto. Howard é dono de uma loja de jóias, e através de diversas negociações, consegue ter em mãos uma opala negra, mineirada por judeus africanos, com a intenção de leiloar-la . A pedra chama atenção do jogador de basquete Kevin Garnett, que passa a ver a joia como um amuleto da sorte e a pede emprestada para o grande jogo da noite, dando seu anel como garantia. No entanto, Howard imediatamente o penhora para poder apostar no tal jogo.

Howard, ou Howie, como é carinhosamente chamado por alguns, está sempre canibalizando, de certo modo, aqueles ao seu redor. A frase “isso não é meu” constantemente sai da boca do personagem. Nem sua própria família está a salvo, já que deve uma quantidade significativa de dinheiro até mesmo para cunhado, e a outras figuras que permeiam o filme a todo o momento. Mas ele não consegue parar e acertar as coisas, sempre sendo impelido a seguir em frente para a próxima aposta arriscada, como se forças além de nossa compreensão o movessem, e não é à toa que o cosmos é uma presença constante no filme, a partir da pedra que seduz tanto Howie quanto Garnett. 

Essa constante auto-sabotagem cria uma narrativa extremamente tensa. A cada instante, um nó se aperta no pescoço de Howard, e tudo parece estar a ponto de explodir. Há poucos momentos quietos no longa, já que os personagens estão falando o tempo todo, com vozes se sobrepondo umas às outras e muitas cenas se tornam um conflito para simplesmente ver quem grita mais alto. E mesmo os momentos mais tranquilos são tensos, já que eles geralmente representam a culminação dos planejamentos do protagonista, que dependem de pura sorte para dar certo, mesmo que para ele seja tudo um risco calculado.

Joias Brutas funciona como uma parábola capitalista e seu protagonista é o avatar perfeito para o sistema, que ao mesmo tempo que é carrasco, é vítima de suas próprias estruturas, que sempre está em busca do momento seguinte, e as consequências para si e aqueles que o cercam que se danem. O regozijo quando as apostas dão certo é incomparável, mas não significa que aqueles que foram prejudicados para que isso acontecesse vão compartilhar do sentimento.

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