Crítica – Made In Heaven (1ª Temporada)

O primeiro plano de Made In Heaven é um close de Tara (Sobhita Dhulipala), com seu rosto levemente maquiado enquanto puxa um espelho para passar batom. O quadro se abre, e vemos seu figurino: um terno feminino, calças sociais e salto alto, algo moderno e ocidental. Atrás da personagem, um enorme quadro está pendurado. Ali presente é outra mulher indiana, mas essa um tanto diferente, com roupas e adereços tipicamente reconhecíveis do país. O recado é claro: a Índia do século XXI pode até aceitar novos costumes, mas a tradição sempre paira sobre todos.

É nesse tom que a primeira temporada de Made In Heaven, série original da Amazon Prime Video, se desenvolve. A produção acompanha a titular empresa de organização de casamentos, chefiada por Tara e Karan (Arjun Mathur), na qual está começando a assumir cerimônias maiores, e na ânsia de superar seus competidores, acaba assumindo trabalhos que vão além de suas funções, como investigar a noiva à pedido da família do noivo ou fazer com que os filhos compareçam ao casamento da mãe. No meio disso, os dois ainda precisam cuidar de seus assuntos pessoais, com ela enxergando problemas em seu próprio casamento e ele tendo de viver com o risco de ser preso devido a sua sexualidade.

Nesse contexto, a produção explora os diversos conflitos que surgem através das diferentes facetas da sociedade indiana se dividindo entre o progresso e a tradição. É interessante observar a postura que Made In Heaven adota sobre esses dois aspectos, longe de soluções maniqueístas na qual aderem somente a um lado, mas sim com visão mais complexa, buscando enxergar o que cada um pode oferecer. Em alguns episódios, o retorno a rituais típicos é a solução de algum problema, enquanto em outros momentos, o apego à tradição é justamente a causa de brigas e discussões.

Todos os episódios se dividem na trama maior, com duração durante toda a primeira temporada, geralmente envolvendo Tara e Karan, e os pequenos dilemas de cada casamento, que se restringem a capítulos individuais. Essa divisão ajuda a manter o interesse na série, já que elementos novos sempre são apresentados, mas às vezes, o equilíbrio se perde, e certas resoluções aparecem sem que o problema tenha sido devidamente apresentado. A quantidade de tramas tem como consequência o tratamento superficial dado à algumas.

Quem sofre com isso também são os personagens secundários, possuíndo suas histórias interessantes, mas desperdiçadas, como a de Jazz (Shivani Raghuvanshi), uma recém contratada da Made in Heaven que vem de um bairro pobre e sonha com riqueza, e sofre com o irmão viciado em heroína, algo apresentado, contudo nunca é lidado de modo apropriado, ou como a empresa competidora Harmony, que é vista criando planos para atrapalhar os protagonistas, mas nada chega a se concretizar de fato.

A estrutura dos episódios também se torna repetitiva em alguns momentos, apesar das tramas em si, serem instigantes, o modo como elas são apresentados é quase sempre o mesmo. São diversos os episódios onde uma das partes deseja algo, que o outro lado não pode saber, todavia que acaba vindo à tona de qualquer modo, e quase coloca tudo a perder, até ser resolvido no último minuto, para a felicidade geral.

Uma decisão peculiar, mas certamente feita para aumentar o alcance do público, é a de colocar os personagens falando tanto em hindi quanto em inglês. É perceptível  a falta de entonação do elenco quando falam inglês nos momentos mais intensos, e a expressividade quando o mesmo acontece em hindi. Obviamente existe um fator comercial ligado nisso, entretanto é interessante observar as novas relações dentro da própria obra.

No geral, Made In Heaven é uma série de potencial enorme, explorando temas universais através da sociedade indiana de modo instigante e divertido, sem que os aspectos mais sombrios desse mundo sejam varridos para debaixo do tapete. No entanto, a falta de foco em explorar certos assuntos e personagens é evidente e, seja por ausência de tempo, ou confiança, acabam sendo desperdiçados. Com o cenário já estabelecido, é possível que esses problemas se resolvam na futura temporada, a habilidade para isso já se encontra presente.

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