Crítica – Pássaros de Verão

Os pássaros talvez sejam reconhecidos como os seres mais livres de todos. Sua liberdade sempre está em torno de poder viver como quiser e aonde quiser. Pois bem, como humanos, nos organizamos em diversas sociedades, cada uma com diferentes culturas e perspectivas. Nossa liberdade acaba sendo sempre deslocada para outras razões, nunca sendo totalmente alcançada. E como ser livre em um âmbito social voltado para a violência e um terror a todo instante? Sobre esse assunto, Pássaros de Verão busca fazer uma análise ainda mais profunda. Busca olhar se os pássaros humanos, no anseio da busca pela vida, acabam tornando-se totalmente presos eternamente numa realidade cíclica.

Isso tudo é feito através de uma trama pelos tempos. Acompanhos a história dos anos 60 até os anos 80, sobre a família de nativos de Wayuu, no meio da Colômbia. Eles encontram-se em um lugar de grande venda de maconha para os Estados Unidos, na força do narcotráfico. Quando essa família acaba sendo rompida pela guerra de diversos clãs pelo controle do comércio da droga, eles observam um possível fim. Um fim de todo o passado daquele lugar, pelas suas culturas e tradições, tentando achar alguma conciliação nesse conflito. Acompanhamos nessa jornada a líder matriarca Úrsula (Carmiña Martínez) e a mulher mais nova, Zaída (Natalia Reyes).

Para expressar essas questões diretamente, o longa utiliza o poder imagético nos acontecimentos. A cada novo tomo, ou seja, novo período histórico, é possível perceber uma destruição de pessoas e lugares. A fotografia de David Gallego coloca sempre planos mais abertos em constraste com os fechados para trazer toda a imensidão pessoal e da cultural da região. Enquanto no início é possível ver diversas festas e celebrações, ao fim, o silêncio toma mais conta e um quase deserto completo é colocado em cena. A tristeza sobre toda a situação paira nos olhos de uma perda quase completa.

A direção de Ciro GuerraCristina Gallego procura ainda um outro olhar, bastante retratado em uma iconografia da Colômbia. Por isso, as encenações são sempre bastante teatrais (a cena inicial da dança, por exemplo), olhando de um jeito mais sincero a essa cultura. Se os primórdios trabalham isso, enquanto a produção vai chegando ao seu fim, é possível ver cada vez mais planos sobre esse domínio da violência. Um dos primeiros, na qual abre o tomo final, mostra alguns homens tirando uma caixa com diversas armas, trazendo a tona esse poderio bélico. A disputa de gangues também, vai transformando-se de um jogo mais político – na primeira festa, poucas armas podem vistas -, para um domínio de força e ultrapassando limites impostos. A sequência final, com uma fala sobre a morte de um informante, ainda deixa mais luz a esse ponto.

O longa, apesar disso, acaba deixando espaçados seus personagens. A importância do mundo e todo o DNA colocado ali é sobreposto em muitos períodos a um desenvolvimento dos questionamentos de cada um. Pouco é visto se esses realmente possuem intenções no meio desse conflito, além do jogo de poderes acabar sempre posto como espaçado. O primeiro tomo, por exemplo, até demonstra Moisés (Jhon Narváez) como uma figura mais impulsiva e na qual pode morrer a qualquer momento. Todavia, isso as vezes é mais ao lado do que propriamente algo da trama. As mortes também colaboram nesse quesito, devido a impulsionarem a discussão desse DNA da violência, contudo deixando de lado maiores compromentimentos narrativos.

Ao fim, Pássaros de Verão traz bastante todo esse debate sobre a prisão em torno do conflito por essa família. A música durante os créditos, rememora mais essa relação cultural perdida por conflitos financeiros e de poderio bélico/moral. Os protagonistas daqui, em muitas vezes, parecem estar mais perdidos pela situação do que realmente possuírem alguma intenção. Isso transmite quase uma perspectiva mais realista a essa história, realmente baseada em fatos reais. Aqui, os pássaros humanos retratados acima não podem ser livres. A única coisa possível para eles é a morte.

Comentários

Cláudio Gabriel

É apaixonado por cinema, séries, música, quadrinhos e qualquer elemento da cultura pop que o faça feliz. Seu maior sonho é ver o Senta Aí sendo reconhecido... e acha que isso está mais próximo do que se espera.

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