Crítica – Reservation Dogs (1ª Temporada)

O nome Reservation Dogs traz consigo certas expectativas. Afinal, invocar uma obra de Quentin Tarantino já constrói certa imagem do que estará por vir, que provavelmente envolve muita violência, diálogos elaborados e referências à história do cinema. Não é o caso da série da FX, que só contém um desses elementos – o último – e está mais próximo do trabalho de um de seus criadores, Taika Waititi, antes dele virar figurinha carimbada no cinema mais mainstream.

Reservation Dogs, criada por Waititi e Sterlin Harjo, acompanha um grupo de quatro jovens nativos americanos que vivem em uma pequena cidade em Oklahoma. São eles, Bear (D’Pharaoh Woon-A-Tai), o “líder” da trupe, Elora (Devery Jacobs), a mais madura e pró ativa dos quatro, e os mais novos Willie Jack (Paulina Alexis) e Cheese (Lane Factor). O lugar em que vivem não possuem muitas oportunidades, então o foco deles é conseguir juntar dinheiro o bastante e ir para Califórnia, tentar uma nova vida.

O modo que eles encontram de arranjar dinheiro é de cometer pequenos delitos, como roubo de cobre, e outros não tão pequenos, como roubar um caminhão de Cheetos. É no meio desse acontecimento que conhecemos o quarteto principal, já estabelecendo muito bem a personalidade de cada um e a relação entre eles, com Bear pedindo que Elora coloque o cinto, gerando protestos dela, “estamos roubando um carro e você tá preocupado com segurança?”, enquanto Willie e Cheese atuam mais como apoio.

Mas Reservation Dogs não é uma série focada nesse aspecto mais criminoso da vida dos jovens, mas sim de explorar a interioridade deles, assim como os problemas que encaram ao seu redor. O local onde eles moram, por exemplo, chamado somente de “a vila” ao longo da série, é frequentemente visto como dilapidado e sem grandes atrativos. A presença de prédios abandonados é frequente – o “quartel general” do grupo é em uma estrutura abandonada – e os adultos são figuras tão perdidas quanto os jovens, como o único policial do local, Big (Zahn Mcclarnon), que tenta posar como mais importante e intimidador do que realmente é.

Apesar da trama de ida a Califórnia ser o elo da temporada, os episódios funcionam individualmente, com cada um explorando um aspecto daquele cenário ou personagem específico. Só que Reservation Dogs evita “esquecer” os dramas dos personagens mesmo em episódios que eles não são o destaque, como, por exemplo, a ausência do pai de Bear, que pesa sobre o personagem já no ínicio da série, até ser “resolvido” mais próximo de seu final. Esse apego e respeito às particularidades de cada personagem ajuda a acompanhar as desventuras dos protagonistas, observando a evolução e os conflitos de cada um.

E há também muito na produção, é claro, que trás a tona momentos particularmente memoráveis, como Bear imitando uma icônica cena do filme Platoon,  mas com tiros de paintball, ou aparição que acomete Bear em alguns momentos, do espírito de um índio que morreu esmagado pelo seu próprio cavalo. O humor às vezes ajuda até mesmo a sublinhar certos problemas estruturais da cidade onde moram, como o médico que atua em três frentes: oftalmologista, gastro e otorrino. A situação é tratada como piada, porém revela a precariedade do sistema de saúde do local.

Assim, apesar do título evocativo de outros trabalhos, Reservation Dogs possui voz própria, destacando alguns dos problemas enfrentados por nativos americanos dentro das reservas, mas sem perder o foco dos dramas mais pessoais de cada um.

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