Crítica – Synonymes
Um homem entra desesperado em um prédio de pessoas, aparentemente, com dinheiro. Ele entra em uma coisa e corre de um lado para outro, meio sem muitas condições de espaço no lugar. Começa a deslizar, assim, e prontamente, tira sua roupa, entrando em um chuveiro quente. Sai de lá e corre entre as diversas portas do prédio pedindo ajuda, porém sem ser atendido. Volta para a casa aonde estava e usa o final da água na banheira, ficando desacordado de frio logo depois. O início de Synonymes poderia ser facilmente até uma comédia meio involuntária. Até porque, qual o sentido de toda aquela situação? A partir do momento que entendemos o estado de falta de dinheiro desse personagem, o longa começa a ganhar contornos maiores. Quando descobrímos sua nacionalidade, tudo abre portas.
Isso tudo porque, na história, Emile (Quentin Dolmaire) é um jovem isralense na qual chega a cidade de Paris refugiado. Após o caso contado acima, ele conta com a ajuda substancial de roupa e dinheiro por parte do casal Yoav (Tom Mercier) e Caroline (Louise Chevillotte). Ele mantém uma relação de certa proximidade com ambos, especialmente o primeiro, em que tem diversas discussões semi-filosóficas. Para se entender naquele meio urbano, Emile compra um dicionário e sai andando pela cidade, em busca de encontrar sua verdadeira identidade.
A produção aqui é uma das que mais corroba a um intrigante sentimento de pertencimento contemporâneo. Nadav Lapid, o diretor, impulsiona isso sob a face de seu protagonista, sem uma voz exata, sem sentimentos muito expostos, totalmente extravagante e possuíndo – ao início – um caráter mais atual com seu percieng. Essa persona, na qual parece não possuir uma forte sinergia com seu país de nascimento, busca em toda a França uma relação de proximidade. Contudo, alguns lados parecem corroborar e outros não. Aquela busca a uma identidade própria, tão onipresente na internet, como Zygmunt Bauman chama de modernidade líquida, parece presente também nas ruas e no dia a dia.
Existe, dentro da trama, uma forte interlocução na busca desse personagem por se entender. Dessa forma, ele lê livros, vai em baladas, encontra-se com outros judeus, faz parte de uma produção pornô gay, entre outras coisas. Por si só, ele não possui um entendimento sobre quem é ou até da sua forma de existência nesse contexto. Seu corpo não passa de um mero instrumento a ser utilizado na busca dessas questões internas e até internas. Até por isso tudo, em uma cena de sexo na metade da produção, tudo é cortado rapidamente. A tentativa desses questionamentos é sempre interpelada por cortes na sua vida.
Nesse sentido, Lapid acaba deixando seu longa um tanto quanto sem um foco claro. Faz sentido, em tudo expressado anteriormente, todavia parece haver um certo desinteresse ao longo do tempo. As quase duas horas de uma certa falta de coesão dramática nessa figura acaba por apenas reverberar ainda mais nesse sentido. Em uma trama que busca uma certa correlação com a contemporaneidade, a narrativa parece esquecer disso em diversos instantes, não buscando mais correlacionar suas temáticas anteriormente faladas. Um certo eixo específico, relacionados a israelenses, é o mais claro nesse sentido.
Não apenas ao explorar sua temática, mas Synonymes sabe bem como colocar sua forma aos olhos de toda esse conflito de identidades. Toda a direção enfoca bastante em uma complicação dos diversos elementos, desde cortes até os planos longos, algo na qual rememora bastante uma coesão estética da nouvelle vague, especialmente de Jean Luc-Godard. Nada mais clara uma referência dessas, já que Nadav Lapid enfoca sua trama nessa relação complexa de localidades do mundo atual. Os sinônimos do título refletem bem as coexistências de nacionalidades e identidades para cada pessoa ao redor do mundo. A internet pode ter impulsionado ainda mais nisso, é claro, entretanto as ruas ainda fazem parte de todos nós.
Esse texto faz parte da nossa cobertura do Festival do Rio 2019