Crítica – Undone (1ª temporada)
É complicado começar a acompanhar uma série na qual se pauta em uma loucura narrativa. Os acontecimento indo para todos os lados possíveis e a falta de uma continuidade em alguns momentos podem parecer problemas, contudo fazem parte desse universo. Undone é um caso perfeito nesse sentido. É uma série que realmente busca elevar esse conceito como um padrão dos acontecimentos, levando a uma tranta um tanto quanto caótica. Se, inicialmente, isso pode acabar sendo uma questão mais complexa de um ponto de vista, de outro eleva os elementos e permite que esse entendimento mais geral vá sendo encontrado aos poucos.
Na história, temos Alma (Rosa Salazar), em que está entediada com sua vida. O mesmo sexo com o marido, a mesma indecisão ao compra feijão, o mesmo trabalho. Ela parece sentir viver nesse eterno ciclo do cotidiano. Quando um acidente de carro acontece, tudo começa a se modificar. Ao ver seu pai Jacob (Bob Odenkirk), na qual já está morto, ela começa a tentar entender como aconteceu isso e observar a vida de um ponto de vista melhor. O problema é que tudo na sua frente está em uma mescla de realidade e mentira.
O uso da técnica de rotoscopia traz a grande dramaticidade necessária ao desenvolvimento da trama. O diretor Hisko Hulsing traz essa sensação de confusão para a dilaceração dos quadros, ao mesmo tempo que brinca com essa ideia. Cada plano parece querer se utilizar de um trabalho estético quase experimental, rememorando bastante alguns trabalhos mais contemporâneos nesse sentido, como Com Amor, Vicent. Hisko, no entanto, traz isso consigo como um jeito de trazer uma liberdade para brincar os pensamentos da protagonista. Como estamos em sua pele, o tempo inteiro não entendemos até qual ponto poderemos ir. E, pior/melhor de tudo, não entendemos se determinada coisa é de verdade ou de mentira.
Esse fato eleva nossa correlação com os personagens da trama. O pai de Alma, por exemplo, ganha cada vez mais camadas e buscamos realmente entender com ela o que teria acontecido. Ao mesmo tempo, essa começa a parecer distante de todos, tentando entender tudo consigo mesma. Por estar quase fora da realidade padrão, sofre retaliações e problemáticas no relacionamento com seu marido Sam (Siddharth Dhananjay) e até no local de trabalho, com o amigo Tunde (Daveed Diggs). Antes de tentar continuar quaisquer questão de sua vida, ela precisa se entender e buscar quais caminhos seguir.
Nesse sentido, a obra caminha para um viés filosófico até bastante inesperado. Apesar de soar – em certos períodos – meio falso e até criar alguns questionamentos inexsitentes dentro do roteiro, essa camada adicionada gera uma concepção temática mais trabalhada para o seriado. Em certos momentos somos deparados com sequências sem uma verdadeira continuidade, contudo, quando trabalhadas sob esse viés, ganham uma carga para um maior entendimento do trabalho realizado.
A primeira temporada de Undone faz uma tentativa bem acima do que realmente poderia se propor. Apesar de certas tratativas de filosofia barata, todo o questionamento de vida proposto em torno da protagonista Alma causa uma narrativa conectada com elementos meio psicodélicos e meio difusos. A ideia é realmente falar sobre personagens confusos, a ponto de não entender para onde vão e aonde estão. Nisso, a série realiza um trabalho quase perfeito. O problema é que existe uma necessidade de base dramática para isso, algo na qual carece em torno de uma estética muito maior do que qualquer coisa.