O Predador é um razoável retorno da franquia

Uma nave é seguida por outra ainda maior. Explosões, portais, tiros e batidas. Esse podia ser um sinal perfeito para o início de um filme da saga Star Wars ou até Star Trek, quem sabe de uma franquia de ação que misture ficção-científica. No entanto, trata-se do pontapé inicial de O Predador, mais novo longa da saga que começou em 1987, com Arnold Schwarzenegger como protagonista. Esse novo capítulo é realmente uma continuidade temporal, dessa vez apresentando uma cientista e um grupo de soldados lunáticos que buscam deter o monstro. No entanto, o grupo acaba descobrindo que existe outro Predador ainda mais poderoso, com planos específicos para o planeta Terra.

Shane Black (responsável pelo roteiro do original) comanda a obra de sua forma bem reconhecida. O seu lado gore é ainda mais explorado, com algumas cenas realmente impressionantes para um blockbuster – destaque para a do início. Sem esquecer sua veia cômica, as piadas não fogem do ponto e perpassam praticamente toda a narrativa, sendo ditas essencialmente pelo grupo protagonista. Apesar de funcionarem como uma válvula de escape em alguns momentos, esse humor acaba se tornando desnecessário conforme o clímax se aproxima, já que o grande final busca uma virada dramática que falha devido à falta de apreço do público em relação aos personagens.

O roteiro do próprio Black e de Fred Dekker se utiliza de alguns esteriótipos e caracterizações para os componentes da trama. O grupo que move toda a história acaba por ter um background raso, sendo cada um reconhecido pelo seu estilo e jeito de ser. Coyle (Keegan-Michael Key) é o engraçadão, Nebraska Williams (Trevante Rhodes) é o bruto e companheiro, Baxley (Thomas Jane) possui TOC, Lynch (Alfie Allen) é o medroso e Nettles (Augusto Aguilera) é o curioso. O grupo se completa com os dois maiores destaques: Casey Bracket (Olivia Munn) é a cientista curiosa sobre os alienígenas e Quinn McKenna (Boyd Holbook) é o líder bruto e sensato. Esses, apesar de terem maior objetivo na participação ativa durante a produção, também acabam por se tornar ainda mais maniqueístas. Isso fica explícito nas cenas em que a esposa fala de maneira patriótica sobre Quinn e nas situações que Bracket parte para a ação, ambas sem nenhum sentido narrativo e que acabam por ser forçadas como piadas por um problema desse desenvolvimento.

É importante falar também – separadamente – da participação ativa de Rory McKenna (Jacob Tremblay). É um papel típico de longas de ação, onde há uma criança com grande inteligência e um relacionamento com os personagens centrais. Nesse caso, Rory é filho do grande protagonista Quinn, citado acima. Ele possui um problema psicológico e algum distúrbio relacionado ao som, característica que faz dele uma criança extremamente inteligente que consegue até, pasmem, decifrar tecnologia alienígena. Apesar de inicialmente ser mais secundário, sua força à narrativa se torna frequente, sendo um dos pontos-chave que amarra todos os acontecimentos. Isso mostra mais uma fragilidade de caracterização, explicitando sua habilidade através de uma sequência só para isso. Novamente, não há um personagem desenvolvido e sim uma característica ambulante.

A continuidade da história funciona pela diversão, mas devido à extrema repetição, acaba se tornando cansativa.  Quando se estabelece a ameaça principal do Predador, sequências da equipe fugindo, sendo perseguidos pelo “vilão” do governo Traeger (Sterling K. Brown), sofrendo algum problema e fugindo novamente. É um recurso tão utilizado dentro do filme que o próprio terceiro ato se baseia em uma situação criada a partir disso, apesar de haver uma subversão desse esquema. Isso acaba sendo uma desculpa para a falta do elementor horror que o antagonista poderia oferecer ao longa, algo que antes era constante na franquia – principalmente no primeiro filme. Talvez o único momento em que isso dá certo é quando Casey está realizando a descompressão e se esconde do alien, fazendo uma referência visual direta à sequência dos velociraptors em Jurassic Park. Além disso, existe uma falta de coesão temática, já que abrem-se várias discussões, incluindo sobre aquecimento global, que acabam por ser esquecidas ou simplesmente não havia um motivo anterior de estarem lá.

A câmera da fotografia de Larry Fong aposta em seguir um caminho mais claustrofóbico de cenas. O movimento da filmagem é feito em muitos planos fechados para personagens e detalhes para objetos de cena (principalmente, armas). Essa funcionalidade não ocorre nos instantes de ação, em que se dá algo tremido e próximo, quebrando o sentido geográfico para com a audiência. Todavia, Fong sabe bem como localizar quem assiste nas situações de diálogos, especialmente nas dentro de ambientes mais fechados. Isso acaba, inclusive, gerando uma certa conexão emocional, muito melhor do que as próprias conversas tentam realmente “dizer”.

Se há algo que possui uma coerência com o pensamento do realizador é a trilha sonora de Henry Jackman. Possuindo o clássico tema de Alan Silvestri para Predador, existe uma certa reimaginação dos tambores e dessa antecipação psicológica da chegada do ser. Ela ainda atua de forma presente no quesito cômico, visto que gera determinadas vírgulas essenciais para a colagem de piadas. Por fim, ainda existe uma sonoplastia de pequenos barulhos, que acabam por lembrar também o barulho do monstro.

O Predador não funciona tanto como um retorno para a saga que ainda está na cabeça dos fãs de cinema, principalmente dos anos 80. Shane Black tenta misturar o que já havia sido criado antes com um estilo autoral, o que cria uma amálgama que, ainda que seja funcional e divertida, não é lá muito coerente. No final de tudo, o gosto amargo na boca mostra que faltou bastante para conseguir transportar a proposta original para as telas de maneira inteligente.  Se o objetivo era conquistar um novo público, talvez o filme até tenha sucesso.

Mas isso poderia ter sido feito de uma forma bem melhor.

3.0
  • O Predador
3

Resumo

Se há uma cena que realmente poderia não ter existido era a final. O mais próximo do bizarro dentro do cinema blockbuster depois de Quarteto Fantástico.

Comentários

Cláudio Gabriel

É apaixonado por cinema, séries, música, quadrinhos e qualquer elemento da cultura pop que o faça feliz. Seu maior sonho é ver o Senta Aí sendo reconhecido... e acha que isso está mais próximo do que se espera.

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