Resenha – A Bruxa Margaret (HQ)

A inspiração principal de A Bruxa Margaret vem do quadro de Pieter Bruegel, mais conhecido como O Velho, Dull Griet, lançada em 1563. A obra tem uma espécie de cenário do inferno, de uma guerra, em que uma mulher, mais na frente, anda tranquilamente enquanto tudo acontece atrás. O caótico ambiente transforma aquela mulher quase numa figura de controle desse ambiente todo, já que parece quase imbatível nesse local. É um pouco dessa percepção que o roteirista Jim Broadbent trouxe para aqui, na HQ. Em um cenário também cataclismico para ser uma mulher, no meio da Idade Média, uma senhora parece acima de qualquer coisa ali.

Na história acomapnahmos Margaret, uma mulher marginalizada e esquecida pelo povo. Com sua casa no meio das águas, ela realiza diversos rituais com o objetivo de encontrar riquezas e também de ter alguém próximo a ela, seja numa amizade ou em um romance. O problema é que os planos começam a dar errado quando, ao tentar ter o controle de tudo, ela não espera o jeito que as coisas vão acontecer.

Na trama, há dois elementos chaves: o estudo de personagem da protagonista e uma espécie de busca eterna religiosa. Nessa primeira parte é talvez a mais curiosa do desenvolvimento da narrativa. É nela que acompanhamos toda a rotina inicial de Margaret rumo a ir atrás de suas buscas mais profundas. O desenho extremamente hiperbólico e estranho de Dix reforça diversos desses elementos, já que, nos rituais, por exemplos, acompanhamos algo bem onírico sendo formado, quase como se estivéssemos vendo um quadro ou um filme que se passa nesse período. A história dá espaço para uma expressão da visão de mundo dela, sob sempre uma perspectiva de uma catarse, um temor.

Já no segundo ponto, ele acontece de forma mais relativa. Aparece logo nas primeiras cenas, mas ganha sempre repercussão quando há presença da personagem principal dentro dos ambientes mais humanos. Assim, quando ela tem contato com cada uma daquelas pessoas diferentes, diversas e também cheias de visões de mundo contrárias, é quase como se ocorresse um sincretismo religioso, mas que nunca acaba de forma favorável. Desse jeito, por exemplo, a relação da cena em que ela é jogada para o alto pelas crianças, enquanto é jogada para fora da cidade pelos adultos, demonstra bem um caminho do diálogo ante o confronto.

Porém, é na segunda parte do arco narrativo que A Bruxa Margaret mais brilha. Nessa parte, o roteiro de Broadbent estabelece um outro personagem, que divide espaço em um cuidado/sacríficio por parte de Margaret. Enquanto ela o usa para um ritual que está sendo realizado, também começa a perceber que sempre um apreço por essa outra figura. Agora, é menos parte de um universo solitário, individual e único, e sim tem particularidades, alguém com quem contar e também uma forma de fuga do seu mundo sempre aterrorizante. A HQ estabelece bem um conflito disso, ao demonstrar como a protagonista sente um certo remorso por estar vivenciado, pela primeira vez na vida, afeto.

O quadrinho sabe colocar bem como esses diversos elementos em um grande desenvolvimento de uma personagem complexa. Enquanto vive no ambiente de caos, como na pintura de Pieter Bruegel, ela se sente extremamente solitária. Mas, ao ganhar uma possibilidade de carinho, de amor, ela se vê em uma situação única. É assim que A Bruxa Margaret se coloca como uma história sobre diversidade, sobre entendimento do outro. Porém, sob uma outra perspectiva e não dos humanos, e sim das temidas bruxas.

Comentários

Cláudio Gabriel

É apaixonado por cinema, séries, música, quadrinhos e qualquer elemento da cultura pop que o faça feliz. Seu maior sonho é ver o Senta Aí sendo reconhecido... e acha que isso está mais próximo do que se espera.

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