Crítica – You Won’t be Alone

Uma criatura que tenta sequestrar um bebê, somente para transformá-lo em outro de sua espécie, ser esse que, mais tarde, cresce e começa a devorar os habitantes de um vilarejo, se tornando aqueles que consome, vivendo normalmente entre eles. Todos os elementos de um filme de um folk horror estão presentes em You Won’t be Alone, mas o caminho escolhido pelo diretor e roteirista Goran Stolevski não é o do óbvio.

Isso porque a perspectiva adotada é a da criatura, se é que pode ser chamada assim, é ela e suas ações que levam a narrativa para frente. Esse ser começa a vida como um bebê, filha de Yoana (Kamka Tocinovski), com o nome de Nevena (Sara Klimoska). Em uma manhã, a mãe encontra sua filha nas mãos da bruxa “Velha Maria” (Anamaria Marinca), com quem faz um trato, para tentar proteger Nevena. A criança será mantida longe do mundo até os 16 anos, quando a bruxa poderá adotá-la como protegida, o que eventualmente acontece.

Mas devido a esse pacto, Nevena cresceu isolada do mundo exterior, e ao sair da caverna que habitava, sua curiosidade pelo mundo dos humanos é atiçada. Ao matar acidentalmente uma camponesa (Noomi Rapace), ela adota sua identidade e passa a tentar viver entre as pessoas normais, experimentando a vida pelo corpo de terceiros.

É essa jornada de descoberta o grande foco de You Won’t be Alone, que privilegia a experiência sensorial do primeiro contato com o mundo do que seus elementos de terror. Por exemplo, os momentos em que Nevena se transforma em outra pessoa, uma situação que poderia ser transformada numa sequência de body horror, se torna mais um momento de curiosidade. Com um corte, Nevena muda de corpo, e imediatamente passa a explorá-lo, olhando cuidadosamente sua nova pele.

Stolevski faz da curiosidade da personagem o grande pilar do filme, boa parte das cenas do filme são compostas de Nevena, em qualquer uma das suas formas, interagindo com o mundo ao seu redor. O diretor faz questão de focar nas expressões da jovem, com constantes closes no seu olhar de interesse nos menores detalhes da vida humana, como a maneira correta de se rir de uma piada. Em uma das cenas, vemos Nevena ensaiando sozinha uma risada, e logo em seguida, a vemos colocando isso em prática.

You Won’t be Alone é um pouco fragmentado em sua estrutura, trabalhando com “blocos” que exploram a vivência em cada corpo diferente habitado pela protagonista, abordando até mesmo questões de gênero, quando ela assume o corpo de um homem, algumas experiências são completamente diferentes, e algumas, como o sexo, são agradaveis, enquanto a experiência feminina era marcada por certa violência.

Aqueles que esperam uma história de terror similar a A Bruxa irão sair desapontados. Não é uma questão de evitar a tarja de “terror” como se o gênero fosse algo menor, longe disso, mas fora dos seus momentos iniciais, You Won’t be Alone, é um poético estudo sobre o que significa, afinal, ser humano.

Texto para nossa cobertura do Festival de Sundance 2022

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